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Denise, a nossa Doutora no cinema de Woody Allen

Denise Araújo, curitibana, formada em Letras, é a primeira "Doutora em Woody Allen". Está de volta à cidade, por alguns dias, revendo sua família e mostrando, com natural orgulho, o diploma que obteve, com sucesso, no mestrado em Literatura Americana na Arizone State University, em Tempe, USA. Como foi contratada como professora da Faculty Associate na Arizone State University deve retornar dentro de poucos dias. No dia 15 de março, quando Fernando Collor tomava posse na presidência, em Tempe, Denise defendia sua tese - "Annie Hall: Woody Allen's Carnival", 100 páginas, na qual, com base nas teorias de "carnavalização" e "dialogismo" de Mikhail Bakhtin, teorista russo que enfoca o estruturalismo e marxismo, desenvolveu um dos primeiros estudos, de nível universitário, sobre a obra de um dos mais importantes cineastas contemporâneos. Há seis meses, fomos os primeiros a publicar, em detalhes, o trabalho que Denise Araújo vinha completando, após quase três anos de permanência em Arizona. O jornalista Wilson Cunha, produtor e apresentador do programa "Cinemania" (Rede Manchete), por nossa indicação, fez uma reportagem sobre Denise Araújo, que foi ao ar numa das audições do programa em novembro do ano passado. Agora, com toda razão, Denise merece entrar na galeria dos "Bichos do Paraná". Afinal, ser "doutora" em Woody Allen é notícia: Para a apresentação de sua tese, Denise exibiu videoclips com as cenas mais importantes do filme "Noivo Neurótico, Nova Nervosa" (1977) - que valeu a Allen o Oscar de melhor diretor (que ele não foi receber em Los Angeles, preferindo ficar em Nova Iorque, tocando clarinete no Michael's Pub, o que irritou a Academia de Ciências Cinematográficas de Hollywood). Bem humorada, Denise compareceu frente a banca examinadora usando o traje de Annie Hall: calças "baggy", colete, gravata e chapéu preto. Sua defesa de tese foi assistida por dezenas de colegas - professores, alunos da Universidade, que, no final, a aplaudiram demoradamente. No dia 11 de maio, houve a cerimônia de formatura e agora a tese, sintetizada em 20 páginas, será editada por uma editora universitária americana. Resultado de mais de 50 visões de "Annie Hall", leitura de dezenas de livros, pesquisas e comparações com toda obra de Allen, "Annie Hall: Woody Allen's Carnival" procura provar que o filme "Noivo Neurótico, Noiva Nervosa", considerado como uma simples comédia, é estruturado em dois níveis e, a exame mais profundo, "é uma obra extremamente séria, versando sobre temas existencialistas". Se o protagonista, Alvin Singer (Woody), é considerado um comediante em um dos níveis, no outro nível é um crítico social que desmascara o melodrama que caracteriza a sociedade americana. A obra é dialógica no sentido de que a voz do autor não é a única voz ouvida no texto, e sim uma delas. Assim, o texto não é expressão da "verdade", e sim uma série de "verdades" vistas por diferentes ângulos de acordo com os vários personagens. As diversas vozes formam uma rede de relações, onde a voz autoritária do sistema, da religião, ou da tradição é apenas mais uma voz. A carnavalização ocorre no surgimento da "voz popular", que é contrária à voz da autoridade e que, de maneira carnavalesca, ironiza e desmistifica as normas tradicionais da família e da sociedade americana. O humor judeu é outro elemento da carnavalização. De maneira cômica, o protagonista revela o mito da família WASP (a tradicional família anglo-saxônica, branca e protestante), de Annie. Também através do humor, a família judia e suas neuroses são retratadas. Assim, a obra de arte, com sérias conotações, adquire a leveza e graça necessárias a uma verdadeira obra prima capaz de agradar tanto superficialmente, se tomada como simples comédia, como em nível profundo, se analisada em suas sérias conotações.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
23/05/1990

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