Login do usuário

Aramis

Um vigoroso drama sobre mais uma vítima da ditadura: Paulo Stuart

Embora os quatro filmes premiados com Oscars estejam com super-rendas, aumentadas após a festa da quarta-feira da semana passada ("Rain Man", Condor; "Um peixe chamado Wanda", Lido II; "Mississipi em chamas", Plaza; e "Ligações Perigosas", Astor/Cinema I), há tamb´me outras opções e, como sempre nos cinemas da Fucucu, repirses. Interessantes, para quem não as viu quando de seus lançamentos - e, em alguns casos ("A família", de Ettore Scola, no Ritz), merecedoras de revisão. No campo das estréias, um média-metragem, baseado em fatos reais e denunciando (mais uma) violência da repressão militar dos anos 70, ganha exibição especial no Groff: "P.S.W. - Uma crônica subversiva", em termos de filme político, um dos melhores lançamentos do ano. Sob o sol de Satã - quando recebeu a Palma de Ouro em Cannes, há dois anos, Maurice Pialat recebeu também vaias: público e c´ritica não perdoaram o fato deste filme inspiradono romance de Geroge Bernarnos (Paris, 1888 - Neuilly-sur-Seine, 1948) ter recebido a premiação maior daquele festival. Intelectual e ativista político francês, Bernanos teve uma vida intensa, tendo sido "Sob o sol de Satã" (1926) o seu primeiro romance. Em 1938, chegou a se fixar na fazenda Cruz das Almas, nas proximidades de Barbacena, em Minas Gerais - pois deixou a Europa nos tensos dias de ascensão do nazismo. Pialat, 64 anos, celebrado por alguns como expoente autoral do novo cinema francês ("Loulou", "Police" e "A nossos amores", que passaram despercebidos no Brasil), em sua adaptação do romance de Bernanos procurou levar a fundo uma temática difícil e polêmica de Gerard Depardieu (como padre) e a delicada Sandrine Bonnaire. Com temática difícil - daquelas obras que se deve assistir com o espírito preparado para ver um filme de tese, em linguagem fragmentada (anulação do tempo) e, que, nos bons tempos em que existiam debates em cineclubes (ah! que saudades do Cine Riviera dos anos 60!) justificaria um amplo cine-fórum. No elenco, o próprio Pialat interpreta o personagem enigmático Doyen Menou-Segras. Um filme de visão obrigatória para quem se interessa pelo cinema de profundidade, para muita reflexão. Desaconselhável totalmente pra quem busca entretenimento fácil. No Cine Bristol, em 5 sessões. Boas reprises - Ettore Scola é hoje um dos cineastas mais importantes da Europa. Aos 58 anos, sua filmografia inclui obras perturbadoras como "Um dia muito especial" (Una giornata particuolares, 1977), reflexivas como "Casanova e a revolução" (La Nuit de Varennes, 1982) vibrante como "O baile" (Le bal, 1983), sociais como "Feios, sujos e malvados" (1975) ou românticas ("Nós que nos amávamos tanto", 1973). Há três anos, Scola realizou um dos mais sensíveis painéis humanos em "A família", que como escreveu José Carlos Monteiro (O Globo), "se projeta entre as mais expressivas obras recentes que reexaminaram, sem preconceito, o papel da família e a permanência dos valores". O olhar de Scola é reminiscente, terno, sentimental, ao longo de oito décadas na vida de um homem comum, em sua vida, seu relacionamento familiar e afetivo. Um roteiro perfeito, a utilização de um único cenário - um imenso apartamento - e um elenco com nomes importantes (Vittorio Gassmann, Fanny Ardant, Stefania Sandreli, Philipe Noiret etc.) e, sobretudo, a imensa sensibilidade de Scola fazem de "La famiglia" uma pequena obra-prima, que merece revisão. Em reprise no Cine Ritz. Outro cult-movie, mas com um enfoque totalmente diverso - neste há violência, a desintegração da sociedade e a explosão de sentimentos inesperados - é "Veludo Azul" (Blue Velvet), de David Lynch, um misto de filme de suspense e terror, com um sexo implícito explodindo. Cerebral, com algumas linhas difíceis de serem entendidas inteiramente, "Blue Velvet" (inspirado no título de um hit de Nat King Cole dos anos 40) revelou Isabella Rosselini e valeu a Dennis Hopper, na época (1986) em ostracismo, um retorno expressivo, num filme que sempre que é reprisado alcança ótimo público. Agora em reprise no Cine Guarany. "Sinfonia de Primavera" ("Pruhlings-sinfonie"), produção da República Federal da Alemanh, 1983, direção de Peter Scbamoni, vale mesmo pela presença de Nastasia Kinski, linda como sempre. Ela interpreta Clara Wiecke, esposa do compositor Robert Schumann (1810-1856), num filme de ritmo lento - longe do vigor de "Amadeus", que, na época, estava em produção e cujo êxito mundial foi que estimulou o lançamento de "Sinfonia de Primavera" no Brasil (existente também em vídeo). Caso contrário, jamais teria chegado às nossas telas. Em reprise no cine Luz. Uma crônica subversiva - No Festival de Cinema Brasileiro de Gramado-88, um dos médias-metragens, 16mm, que provocaram maior impacto foi "PSW - Uma crônica subversiva", conforme, na ocasião, aqui registramos. Produção de José Joffily Filho, ralizado por dois de seus alunos do curso de cinema da Universidade Federal Fluminense, esta reconstituição, com atores e atrizes conhecidos e que praticamente trabalharam de graça (Antonio Fagundes, Paulo Mosca, Renato Borghi, Maria Padilha e Antonio Abujamra) reavivou mais uma violência da ditadura militar: o "desaparecimento" de Paulo Stuart Wright, catarinense de Joaçaba, deputado estadual em Santa Catarina, cassado pela revolução e que atuando na clandestinidade foi seqüestrado e desaparecido em 4/9/1973. Na época, Wright chegou a ter muitos contatos em Curitiba (seus dois filhos residiram em Colombo, ao que consta) e alguns militantes de esquerda o conheceram bastante. Portanto, a exibição deste documento-drama, realizado pelos jovens Paul Halm e Luiz Fernando Dias Campos, poderia merecer uma estréia com maior repercussão política (afinal, não custaria o Chico Alves ter promovido uma pré-estréia, com debates, no qual os que conhecem Paulo Stuart Wright, inclusive seus filhos, estariam presentes). De qualquer forma, é um filme especial, que merece ser visto. No ano passado, em todos os festivais do cinema brasileiro em que foi apresentado, "PSW - Uma crônica subversiva" recebeu, merecidamente, premiações. xxx Por último, um rápido registro: no São João, estréia um ficção científica sem maiores referências - "Starship - O guerreiro do espaço", de Roger Christian. Uma pena que o mordaz e interessante "Dirty Harry na lista negra", quinta aventura do detetive criado por Clint Eastwood, não tenha sido descoberto: é uma gozação crítica ao cinema de terror e violência, com uma seqüência divertidíssima ironizando "Bullit" que merecia ser visto. Como sempre, acabou esquecido! LEGENDA FOTO 1 - Antônio Fagundes e Renato Borghi em "P.S.W. - Uma Crônica Subversiva": um média-metragem reconstituindo um fato real. O grande lançamento do cinema político da semana em exibição no cine Groff. LEGENDA FOTO 2 - Com 7 indicações, "Mississipi em Chamas" ficou apenas com um Oscar: o de melhor fotografia, para o inglês Peter Biziou, ex-marido da poeta curitibana Christina Gebran. O (ótimo) filme dirigido por Alan Parker está em exibição no Plaza.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Cinema
8
07/04/1989

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br