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Aramis

Um perfil dos homens que eram constituintes em 47

José Cury, hoje aos 65 anos - intensamente vividos e amados, pois ao lado de sua vida profissional sempre foi um grande boêmio, homem de muitas estórias & mulheres de uma Curitiba diferente - foi, em seus primeiros anos de imprensa, também um repórter ativo e bem-humorado. Folheando-se alguns exemplares de "O Livro" - uma publicação que, passados quase 50 anos, mostra que a força da palavra escrita permanece, encontra-se textos que, curiosamente, mostram-se informativos e atuais. É o caso de "As 37 Cadeiras", que ocupando seis das 78 páginas dos número 97 de "O Livro" (agosto de 1947) apresentava um perfil da Assembléia Constituinte do Paraná. Na época, em seu oitavo ano de circulação ininterrupta, "O Livro" já era impresso em off-set e trazia belas fotografias de Salomão Scliar, Foggiato, Janina, Ararin Heckel e Ibsen - homônimo do dramaturgo. xxx No momento em que estamos às vésperas da eleição de uma nova Constituinte - que, após 40 anos, formulará a nova Carta Magna do Estado, a reportagem "As 37 Cadeiras" - com texto de José Cury e fotografias de Scliar, dos Constituintes de 1947 - adquire mais do que um toque nostálgico, uma conotação histórica e informativa. Motivo que justifica a sua transcrição. xxx "Até que enfim está o Paraná reconstitucionalizado! Depois de 10 anos - dez anos longos e aguados - volta ao Estado o regime legal, com sua carta magna de 1947, dentro do espírito aerodinâmico do tempo que vivemos, ou, pelo menos, dentro da média das aspirações populares, consubstanciadas na manifestação legislativa de seus 37 representantes. Quatro meses de gestação, com estudos e debates, sobre matérias de emendas no corpo de um orgânico anteprojeto constitucional e vem à luz, no memorável dia 12 de julho - um dia para guardar - o documento que decide dos destinos do Paraná, que delimita direitos e deveres, firma princípios e traça diretrizes à ação dos novos legisladores paranaenses. O textos não será um primor, mas há de ser satisfatório porque traz um pouco de tudo. E isso é explicável. Há um pouco de tudo na Assembléia Legislativa do Paraná, que embora não tenha sido sempre legislativa, mas constituinte, é, em todo o caso, uma Assembléia à direita. Isso não quer dizer que seja uma Assembléia de Direita - não obstante existirem ali figuras que jogam bem nessa ala. Há pessedistas, udenistas, trabalhistas, perrepistas, populistas, comunistas, progressistas, lupionistas, floristas. Há alguns que não são. Há outros que são contra. Bem ou mal, eles representam as diferentres correntes da opinão pública em que está dividido politicamente o Paraná de nossos dias. São ao todo trinta e sete ocupantes, integrando sete bancadas diferentes, das quais a do P.S.D. sem ser tecnicamente a majoritária, é a maior de todas. À frente dela está hoje o deputado Alcides Pereira Júnior. Sua ascensão à lideração é recente e resultado da primeira rebordosa de significação por que passou o P.S.D. dentro da Constituinte de 1947. Até então a bancada vinha sendo conduzida pela bauta do deputado Firman Neto, auxiliado pelo ardor combativo do seu colga Oscar Munhoz. Um dia as coisas se encresparam. E os dois combativos pessedistas, acompanhados pelos não menos combativos colegas Pinheiro Júnior, até aí secretário da Assembléia, e Francisco Acioly Filho romperam com a direção de seu partido. Mudou o líder. Mudou o secretário. Mudaram muitas coisas. Agora, nessas posições estão os deputados Alcides Pereira Júnior, Hélio Setti e Waldomiro Pedroso. Depois da bancada do P.S.D. segue-se em tamanho a da U.D.N., onde pontifica com o seu verbo inflado e um tanto rouco o deputado Laertes Munhoz, parlamentar já experimentado e dos entendidos em questões constitucionais. É dele um anteprojeto muito substancioso que serviu de base à comissão de constituição na elaboração do projeto da carta magna do Estado. Foi do seio dessa bancada que nasceu, por causa de um discurso do deputado Bacelar, o primeiro acidente de vulto que ameaçou toldar o límpido céu aberto que decorriam nos primeiros meses os trabalhos dos constituintes. Mas o acidente não passou de uma nuvem... que passou... Vem depois a bancada do P.T.B. Por motivos que não vieram a público, houve mudanças também na bancada petebista. E em lugar do deputado Aldo Silva, cuja combatividade lhe valeu mais de um incidente que deu movimento à crônica parlamentar, ocupou a liderança o seu colega Júlio Rocha Xavier. As demais bancadas são de reduzido número de integrantes. Destas a maior é a perrepista, de oposição, com o deputado Portugal Tavares como líder. O P.C.B. está com um único representante, o mesmo se dando com o P.S.P. Os últimos acontecimentos políticos nacionais, trouxeram para o representante do partido Comunista, Vieira Neto, dias duros. E ele os tem atravessado com inegável brilho - como aliás o reconhecem os que dele divergem. Diante dos últimos fatos, internos e externos, os trabalhos da Assembléia têm transcorrido mais animados - sujeitos a tomarem a todo instante um caráter acalorado. Nunca se pode prever o que vai acontecer. Já não poucas vezes o deputado João Chede, sempre calmo e bem posto, tem que se fazer duro para vencer a forte rebeldia e a carga que sobe do plenário até a respeitável mesa presidencial. A oposição que era pequena agora está mais fortalecida e como não há, ao que parece, questões fechadas em matéria constitucional, tudo ali dentro é possível. Sob influência dessas marés - que nada tem a ver, aliás, com o deputado Marés de Souza - vão transcorrendo os trabalhos constitucionais. O número de emendas apresentadas foi enorme, quase esmagador. Por isso, os trabalhos foram intensificados com a realização de sessões extraordinárias. Foi um labor sem tréguas. Naturalmente os quatro meses que decorrem desde a instalação da Assembléia constituem um tempo ainda muito curto para se poder situar cada um dos deputados ocupantes das augustas trinta e sete cadeiras. Ainda não é possível saber quantos deles estão verdadeiramente à altura das cadeiras em que se assentam. Por ora, já fazemos muito se pudermos dar aos nossos leitores uma idéia do aspecto físico de cada um através das músicas que nesta reportagem devemos à mágica de ângulos do fotógrafo Salomão Scliar. Com isso, poderá o eleitorado ligar o nome à pessoa dos candidatos que levaram ao poder legislativo estadual. Não há dúvida que esses homens representam a vontade do eleitorado. Pelo menos em relação aos pleitos anteriores de nossa história política eles são muitíssimo mais representativos. Isso, aliás, é fácil de constatar no simples reconhecimento de que os deputados eleitos pelo interior ali são maioria. A começar por João Chede, o mais votado dos candidatos eleitos, numerosos homens do Interior integram a Assembléia e se empenham por defender e resolver os problemas do Interior. Mas não há somente numerosos homens do Interior. Há também numerosos homens moços - o que é sem dúvida um dos sintomas muito promissor porque exprime a confiança do povo na geração nova, deixando claro que ele espera do ardor característico dos novos um pouco mais de audácia na tarefa de legislar. Não será certamente dos mais brilhantes o nível intelectual dos constituintes paranaenses de 1947. De resto, não é ainda de grandes culturas livrescas que necessita o Paraná. É principalmente de homens de boa vontade, honestos e patriotas, que não se atemorizam diante dos imensos problemas primários que o assoberbam e cuja solução não pode ser retardada ainda que não agrade muito a uns tantos quantos cavalheiros agarrados à situação de atraso de nossa economia, tão dolorosamente mergulhada na fase do carro-de-boi".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
2
19/10/1986

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