Um filme sobre Samuel Wainer e a Initial que traz cult-movies
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 23 de abril de 1992
A vida de Samuel Wainer (1912-1980), por ele contada num dos melhores best-sellers dos últimos anos ("Minha Razão de Viver", editora Record, 1988) já tem um pré-roteiro definido e o mais certo dos diretores para levá-lo ao cinema: seu filho caçula, Bruno, 31 anos.
"O tema naturalmente, afetivamente me fascina, os direitos pertencem a minha família e este seria o trabalho para eu me lançar na grande aventura de fazer um longa-metragem. Mas não tenho pressa! Enquanto a situação do País, em termos de cinema, continuar como está, não há condições de imaginar uma produção como esta, mesmo que associados a produtores de outros países".
Pelo telefone, Bruno fala de seus projetos imediatos: fazer da pequena - mas organizada - Inicial Brasil, uma distribuidora forte, "aproveitando todas as brechas do mercado audio visual". A empresa - representante da Initial francesa, hoje um dos grandes grupos europeus, ligado a conglomerados econômicos que atuam em várias áreas, começou com o pé direito: em menos de 5 meses, "Delicatessen" cult-movie produzido pela Initial e que obteve 4 Cesars (o Oscar do cinema francês) no ano passado, já ultrapassou os 100 mil espectadores em São Paulo, Rio, Vitória, Brasília, Salvador e Porto Alegre, "aliás a melhor surpresa", com mais de 10 mil espectadores"- o que estimulou a Initial a programar também para a capital gaúcha a estréia simultânea ao Rio/SP de "A Viagem do Capitão Tornado", de Ettore Scolla, nos primeiros dias de maio. Em Curitiba, em exibição desde o último sábado, 17, no Lido I, a carreira de "Delicatessen" não está sendo tão promissora: nos quatro primeiros dias apenas 1.232 espectadores, o que pode condená-lo a sair de cartaz já nesta sexta-feira. O que será mais uma demolição do mito de público "culto", "refinado" e "exigente", pois em todas as cidades em que vem sendo exibido - desde a sua estréia em Paris, há pouco mais de um ano, este filme da dupla Marc Caro e Jean Pierre Jeunet, tem sido saudado com maior entusiasmo da crítica - e, paralelamente, uma grande presença de público.
Inovador, satírico e inteligente em sua concepção, esta estréia no longa-metragem de um ex-quadrinista (Caro) e um realizador de curtas (Jeunet), que com "Foutaises" recebeu o prêmio Jaques Tati (entre outros) no festival de Clermont-Ferrand, "Delicatessen" tem um clima entre a science-fiction e o surrealismo, que remete uma revisão atualizada de Tati ao clima de "Brazil"(1989, de Terry Gillan) uma das influências admitidas por seus realizadores.
Aberto para muitas leituras, humor em termos apocalipticos, com uma ação que satiriza o canibalismo (um tema que vem sendo abordado em vários filmes recentes) e a sobrevivência de um grupo de pessoas estranhas numa sociedade day after a uma catástrofe nuclear, "Delicatessen" é um filme que exige (re)visão, para absorção de todo seu humor cruel, sátira inteligente e, sobretudo, inovação em forma de "contar" cinema. Enfim, um filme-inteligência, mas que "não fica restrito aos cinéfilos, prova disto é seu sucesso em todo mundo - mesmo no Japão - "e que me levou a preferir o circuito da CIC, em Curitiba, do que as salas da FCC, que atingem apenas a uma faixa cativa de público de filmes de arte" explica Bruno.
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Com a experiência de 19 longa-metragens em cujas equipes atuou - de 2º assistente de direção em "Bye Bye Brasil" (78) a direção de produção de ainda inédito "Brincando nos campos do Senhor", Bruno associou-se ao também cineasta Marc Beauchamps, 32 anos, francês, com um curriculum mais extenso - como fotógrafo, assistente e diretor em mais de 60 filmes (curtas, longas, documentários e filmes publicitários), que até o ano passado era o correspondente francês da "LA 5" na América Latina. Juntos, na Initial Brasil, entram firme no mercado áudio-visual, com um catálogo de longas, seriados, desenhos animados, clips etc. A empresa já faturou mais de US$ 4 milhão em seu primeiro ano, o que estimulou os associados franceses a investirem cerca de US$ 800 mil. Com mais de 400 títulos a oferecer ao mercado tradicional e principalmente a televisão, a Initial tem o fille-mignon de filmes que, neste ano, estarão no circuito dos festivais, como os recém-concluídos "Howard's End" de James Ivory ( o diretor de "Uma Janela Para o Amor", que representará a Inglaterra em Cannes, a par do dia 7 "Night On Earth" último longa de Jim Jamursch ("Downbylaw", "Estranhos no Paraíso"), "Prooff" da australiana Jocely Mdorhouse; "Virginia", do iuguslavo Srajan Karanovic. Filmes apresentados em festivais de 91 - mas ainda inéditos no Brasil - como Ä Viagem do Capitão Tornado" título dado a "Capitaine Fracasse" (publicado em 1863, adaptado por Ettore Scola do romance de Teópile Gauthier (1811-1897), (o nome Fracasso, do original, foi desaconselhado pelos exibidores), "Max, Mon Amour" de Nagishima Oshima ("O Império dos Sentidos") entre outros, também já estão tendo seus lançamentos preparados.
Mas a Initial não ficará apenas na distribuição da produção de qualidade internacional. Já há negociações para cuidar do relançamento no Exterior de quatro dos mais famosos filmes de Glauber Rocha (1983-1981): "Barravento" (61/65), "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (64), "Terra em Transe" (67) e "O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro" (69).
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Bruno Weiner e Marc Beachamps, jovens cineastas entrando na área da distribuição para trazer ao Brasil o melhor do cinema independente europeu. Começam com "Delicatessen", em exibição no Lido I.
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