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Teatro Paranaense: mudanças já?

A Classe Teatral Paranaense tem feito, nos últimos anos, um grande esforço no sentido de se organizar e tornar mais dignas as profissões ligadas ás Artes Cênicas, através da criação do seu Sindicato e outras medidas não menos importantes. Ma se, por um lado, exige-se, a nível formal, um determinado grau de profissionalismo dos artistas e técnicos que participam dos espetáculos, a ponto de gente bastante talentosa não conseguir a legitimidade do seu registro por falta de "documentação comprobatória", por outro as medidas tomadas pelo Sindicato não apresentam um resultado prático no tocante á qualidade dos espetáculos . As mesmas e velhas formas "semi-amadorísticas", improvisadas e desprovidas de maior criatividade, são ainda a constante da maioria (e não da totalidade) das montagens locais. O que acontece de "apenas razoável" acaba por nos saltar aos sentidos como "coisa muito boa", tal o nível dos demais espetáculos. E é quando um espetáculo (bom espetáculo) destaca-se isoladamente numa temporada, que verificamos o quanto foram ausentes outros "bons espetáculos". Na atual temporada, "Virtu - O Ser Conjugado" foi uma agradável surpresa . O trabalho trouxe para o palco todas as picardias e ludicidade tão necessários à uma boa montagem. Mesclando artistas de bastante experiência com atores da "noiva safra", Luthero Almeida consegue um resultado profissionalíssimo, de trabalho bem feito e, sobretudo, bem acabado. E o que está mais presente em "Virtu" é justamente o que mais carece o nosso teatro: Produção, com "p" maiúsculo. Verificando a Ficha Técnica, no tocante aos nomes escolhidos para "armar" a peça (senários[cenários], figurinos, iluminação e etc.) é fácil entender porque resulta tão bem. Gente que conhece! No mais, aquilo que se teve oportunidade de assistir repete o "velho esquema": espetáculos fraquíssimos do ponto de vista de produção e acabamento técnico (tanto no tocante à montagem como no que concerne à interpretação) que na estreia sente-se que "faltava ainda um mês ou mais para ir à cena" (meu Deus, até quando?). E não é só isso. Apesar da regulamentação da profissão e da extrema vigilância do Sindicato (às vêzes[vezes] às raias do exagero), vemos em cena atores que só são reconhecidos como profissionais por "força de regulamento". Isso faz com que se assista à pessoas com sabida competência e experiência para realizar bons trabalhos envolvidos em "coisas ruins", produções mal acabadas. É, por exemplo, o caso de "Alegro Desbum", dirigido por Marcelo Marchioro, que havia conseguido um bom espetáculo na temporada passada com "A Cantora Careca " (cuja direção não pode assinar por não ter seu registro aceito pelo Sindicato) e que acabou por ter como sua primeira assinatura "Oficial" de espetáculo profissional o "Alegro" vemos atuações de bom nível como as de José Maria Santos e Claudete Pereira Jorge mescladas ao amadorismo e ineficácia de Raquel Stankievicz, uma estreante cuja performance fica aquém dos nossos atores do Teatro Amador. Outro fator a ser considerado é a escolha dos textos que têm sido apresentados por nossas Companhias. O que é inédito enquanto peça é velho enquanto tema tema, repisando antigos e "carcomidos" chavões. Por outro lado, os textos já conhecidos são apresentados sem quase nada de inovação, resultando em coisa desatualizadas e "chatas". Não que não seja bom rever textos de qualidade . Mas é necessário que o tratamento dado ao espetáculo seja atual. Com qualquer atrativo "com sabor de novo". É D'Ávila desperdiçar a sua experiência e o seu reconhecido talento com um espetáculo como "Esta Noite Choveu Prata", apresentando a peça como se fazia "nos tempos de Procópio". Pense que o "Alegro Desbum" de Oduvaldo Viana Filho merece ser remontado "milhares" de vezes, desde que quem o realize procure relê-lo com cores atuais, tal qual faria o próprio Vianinha (não basta atualizar as piadas ou as referências, é preciso reler o espetáculo como tal, dentro do contexto de hoje). Há, ainda, o caso das peças alemãs (ah, que saudades das infantis!) sempre em co-produção com o Instituto Goethe. As duas apresentadas ultimamente, "Vamos Transar" e "Alles Plastik", repetem o mesmo equívoco. Ambas são dirigidas à uma faixa juvenil de público. Acontece que, até onde eu entendo de juventude brasileira (já fui e convivo com a atual), a temática tratada é abordada de uma forma completamente distante da nossa realidade. Não acredito que falem de forma a atingir o jovem latino-americano, como se pretende. Alem do mais incorrem em pretensões (como em "Vamos Transar") tais como a discutir toda a problemática dos métodos anticoncepcionais em, aproximadamente, três minutos de texto, quando o assunto é complicado e controvertido até mesmo para os médicos especialistas . E o que as peças do Grips apresentavam de melhor, nas atuais montagens e co-produção com o Instituto Goethe é inexistente: a produção bem cuidada. Sente-se, a exemplo dos outros trabalhos, o improviso e a falta de um planejamento mínimo necessário. Ora, se temos bradado tanto ultimamente por mudanças sociais e políticas (e a classe artística sempre foi um baluarte desses "clamores"), é bom lembrar que se não houver uma atitude de mudança a nível de nós mesmos, do nosso trabalho, a legitimidade das nossas reivindicações será sempre bastante questionável. Penso que a Classe Teatral do Paraná está no seu mais legítimo papel quando reivindica e "batalha" por maiores recursos e maior apoio do Governo do Estado para o nosso Teatro. Mas o que não dá mais p'ra confundir, em benefício do próprio Teatro do Paraná , é "falta de critérios de produção" com "falta de apoio dos órgãos oficiais", muito menos "falta de recursos". Para que possamos ter, em termos de Teatro, um "Feliz Ano Novo", ou uma Feliz Temporada Teatral Nova", acredito que a receita seja relativamente simples e, ultimamente , muito bradada por nós mesmos : "Mudanças Já". No momento em que os nossos produtores passarem a ser mais criteriosos na escolha de textos, de atores e técnicos e, sobretudo, dedicarem maior cuidado a "Produção", os resultados serão bem diferentes. E os talentos nós temos aqui mesmo no Paraná . De outra forma, nossos trabalhos terão sempre aqueles "gostinho de comida de geladeira "e um inconfundível "cheirinho" de "SEMI-profissional".(Celso Ribeiro Fonseca).
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
RETROSPECTIVA 85
22
31/12/1985

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