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Aramis

Teatro negro de Praga e a brasilidade do <<Divino>>

Nesta semana, dois bons espetáculos em cartaz no Teatro Guaíra. No grande auditório, uma apresentação internacional - o Teatro Negro de Praga, que dentro de sua excursão pela América do Sul, programou dois diferentes programas para os cincos dias em que permanecerá em Curitiba: << a Semana dos Sonhos >> (hoje e amanhã) e << A Bicicleta Voadora >> (sábado e domingo). A grande motivação para o público comparecer ao Guaíra e aplaudir este grupo até agora totalmente desconhecido no Brasil é que se anuncia o mesmo como utilizando a mesma técnica do << Mumenchaz >>, formado por mímicos suiços e que, em duas temporadas, encantou os brasileiros. O Teatro Negro de Praga, fundado há 19 anos, tem este nome por utilizar um palco totalmente negro, onde aparece para o público somente o que interessa ao entendimento da mensagem a ser transmitida. Os atores, vestidos de preto, ficam invisíveis ao espectador e, consequentemente, os adereços o objetos têm condições de movimento. Na opinião do diretor, Júri Snerc, << o efeito conseguido através do << gabinete negro >> não se torna o resultado da comunicação mas o ponto de partida para a criação de seu trabalho >>. Salienta ainda tratar-se << de uma maneira de se conseguir uma metáfora cênica e de mímica, materializada pelo movimento de objetos artísticos e dos artistas, sendo que os movimentos deles são organizados pela Música. Um novo mundo de sonhos e encontros incomuns nascem para os palcos, parecendo pinturas surrealistas e sempre fantásticas, onde a imaginação humana mostra não ter limites >>. *** Enquanto o Teatro Negro de Praga é um grupo que apresenta um espetáculo onde a tecnologia e a vanguarda se encontram, no auditório Salvador de Ferrante temos um espetáculo das mais profundas raízes brasileiras e que, com inteira justiça, mereceu os maiores elogios da critica e as principais premiações, no ano passado: << Na Carrêra do Divino >> (21h30min, até domingo ). Produção do grupo Pessoal de Victor, ligado a Universidade de Campinas, << Na Carrêra do Divino >> representa um trabalho de equipe, coordenada por Carlos Alberto Sofredini. Pesquisando em várias fontes - especialmente em << Os Parceiros do Rio Bonito >>, de Antonio Cândido, criou uma peça profundamente brasileira, valorizando o caipira do interior de São Paulo - numa trajetória em que se integram os elementos do folclores, da tradição oral - em contrataste aos problemas sociais e econômicos, que o transformam em marginais nas grandes cidades. Assim o espetáculo, conduzido por uma honesta trilha sonora (editada em lp pela RCA) fala de mulas-sem-cabeça, boitatá, roçados, amor sertanejo crenças e superstições que, raramente, tiveram estudos de maior profundidade - apesar de tão identificados com a formação de nosso país. A aceitação que << Na Carrêra do Divino >> obteve junto as sofisticadas (e aparentemente intelectualizadas) platéia do Rio e São Paulo, foi uma configuração, em teatros, de uma tese que há muito tempo não nos cansamos de aqui defender de todas as formas e maneiras: a importância de se (re)valorizar a cultura não urbana, seja através da música, do cinema e do teatro. Assistir << Na Carrêra do Divino >> é, antes de tudo, uma questão de saber (aprender) ser brasileiro - e se orgulhar de nossa cultura - em seu sentido antropológico.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
1
24/07/1980

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