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Aramis

Suspense, sexo & cinismo

As primeiras imagens, aéreas, enquanto os créditos se sucedem, mostram os edifícios e monumentos de Washington. Uma seqüência que mais do que bem colocadas visões de cartão-postal, procura situar o espectador frente aos símbolos do poder oficial - a Casa Branca, o Congresso e, imponente, o Pentágono - o maior edifício administrativo do mundo, ocupando uma área de 149 acres e que desde sua inauguração, em 15 de janeiro de 1943, é, com seus imensos corredores e salões estratégicos, o centro nervoso da defesa americana. A seqüência seguinte vai para os salões luxuosos do histórico Shoreham Hotel, inaugurado em 1930 e que ao longo destas últimas seis décadas sediou importantes acontecimentos diplomáticos, sociais e oficiais da capital americana. Dos bailes de posses de Franklin Delano Roosevelt (1882-1945) a Ronald Reagan - O Shoreham identifica-se aos momentos mais festivos da vida política americana. E justamente de uma festa de posse de um presidente, parte a ação de "Sem Saída" (Cine Plaza, 5 sessões), com a entrada do garboso oficial Tom Farrell (Kevin Costner), apresentado por seu colega de turma, Scott Pritchard (Will Patton) ao secretário da Defesa, David Brice (Gene Hackman), que o trata friamente. Fato que não o incomoda, pois em cinco minutos estabelece uma imediata relação com uma das mais belas mulheres presentes na festa, Susan Atwell (Sean Young), com quem, 10 minutos depois, está numa transa inflamada no banco traseiro de um Lincoln Continental - enquanto o discreto motorista faz um roteiro "Washington by Night". Só depois de múltiplos orgasmos, refestelados nas amplas poltronas do veículo, há a apresentação: - "Muito prazer, meu nome é Tom!". - "Prazer. O meu e Susan. Susan Atwell". Que prazer, sem dúvida! Por esta seqüência, pode-se até ver no cinismo e amoralidade aparente uma nova espécie de humor crítico - semelhante àquela que faz o detetive Chris Leoce (Richard Dreyffus), encarregado de um exercício de "voyerismo" oficial, vigiando a bela Maria McGuirre (Madeleine Stowe), amante de um perigoso assassino, "Stick" Montgomery (Aidan Quinn) em "Tocaia" (Cine Astor, 5 sessões) acabar tendo um tórrido e perigoso envolvimento com a mulher que deveria somente observar - mas com quem acaba indo para a cama (ver matéria na capa deste caderno). O oficial Farrel também vai para a cama - depois do início sexual no banco do Lincoln Continental - com Susan, num envolvimento que trará sérias complicações. Em "Tocaia" (Breakout, 87, de John Badham), o detetive Chris acaba sendo confundido com o assassino "Stick" - e tendo que se disfarçar de mulher, para fugir do cerco policial numa das seqüências mais divertidas. Em "Sem Saída", o comandante Farrell, herói da marinha por ter salvo um subordinado, em tempestade no alto mar, volta ao Pentágono à convite do secretário Brice, como reforço para a guerra suja contra a oposição que uma raposa política do Senado, senador Duvall (Howard Fuff) - apoiado pelo FBI - lhe move contra seu projeto altamente contestável (técnica e financeiramente) de desenvolver um super-submarino, "maior do que um porta-aviões e que interessa aos que o estão construindo", como diz, satiricamente, um dos personagens a certa altura. "Tocaia" e "Sem Saída" - exibidos coincidentemente nesta semana - são exemplos de um cinema atualíssimo, up to date na colocação de aspectos diversos do poder (e da repressão), mas que se identificam pelo cinismo e hipocrisia. Da espionagem à vida de uma bela mulher, para através dela poder prender um criminoso foragido em "Tocaia", há toda a farsa que o terrível Scott monta em "Sem Saída" para proteger seu ídolo (e paixão homossexual) David Brice, responsável pela morte da amante Susan - também a amante do oficial Farrell - estabelecendo-se uma teia de intrigas que passa ao espectador mais do que simples suspense. Washington, como Brasília, uma cidade que vive e respira o poder, as intrigas e as tórridas relações sexuais não oficiais, é um próprio cenário-personagem de "No Way Out" - título, aliás, dos mais felizes e que, desta vez, foi conservado pela Columbia. Realmente, uma trama sem saída, na qual ironicamente o amante 2 - Farrell - da mulher assassinada pelo amante 1 (o secretário Brice) é designado para conduzir uma investigação fictícia em torno do assassino espião, Yuri - um homem que até os últimos minutos se tem a certeza (por parte do espectador), de que nunca existiu, mas que chega, num final surpreendente - e, desta forma, aberto a novas interpretações. "Tocaia" e "Sem Saída" são dois dos filmes mais inteligentes da temporada - por sinal em alta qualitativamente em termos de programação. "Tocaia", por suas diferentes leituras que passam do simples thriller policial (embora basicamente, para o público, assim o seja), merece um registro à parte - o que será possível, já que deve permanecer por mais algumas semanas. Já em relação a este "Sem Saída", não se sabe: a Columbia e o Cine Plaza têm "queimado" bons filmes ali lançados (alguns até em estréia nacional), que são abruptamente retirados de cartaz após 7 dias. Portanto, como garantia, quem se interessa em ver um filme fascinantemente atraente é bom aproveitar algumas das 5 sessões de hoje. LEGENDA FOTO - Tom e Susan: paixões complicadas em Washington.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
24/02/1988

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