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Aramis

Samuca, professor do Paraná

Quando deixou a chefia da Casa Civil no governo Paulo Pimentel, Samuel Guimarães da Costa recebeu um presente que muito o emocionou. Numa iniciativa do fotógrafo Bob (Roberto Abreu), hoje aposentado, mas que por mais de 30 anos documentou as andanças dos governadores paranaenses, foi feita uma foto do quadro existente no Salão Vermelho do Palácio Iguaçu, no qual é reproduzida a chegada de Zacarias de Goes e Vasconcelos ao Paraná. Numa habilidosa montagem, Bob substituiu o rosto de um dos integrantes da comitiva do primeiro presidente da Província, pelo rosto de Samuca. - "Era para "provar" que eu já fazia discursos para o baiano Zacarias de Goes e Vasconcelos" - diz, rindo, ao lembrar-se da brincadeira que resultou num quadro de sua biblioteca. Realmente, os muitos amigos de Samuel costumam brincar, dizendo que ele vem assessorando governadores desde os tempos da primeira república. Não é verdade, claro, mas a partir de Manoel Ribas, foram poucos os donos do poder que dispensaram sua cultura, seu bom senso e sua habilidade em traduzir em palavras exatas, sintéticas, como bom jornalista, aquilo que uma autoridade maior deve dizer. Redator do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda - que correspondia ao DIP no Paraná, Samuel foi incumbido pelo diretor Gaspar Velloso (mais tarde senador) a preparar pequenos textos que deveria deixar, estrategicamente, sobre o prato do interventor Manoel Ribas, nas homenagens que merecia. - "Eram pequenos textos, com dados a respeito da obra que ele estava inaugurando, coisas assim. Entretanto, Manoel Ribas, homem simples e objetivo, acabava mesmo fazendo um improviso". xxx O conhecimento de Samuel Guimarães da Costa sobre as coisas do Paraná - e sua visão cada vez mais lúcida e clara - não caíram do céu nem foram aprendidas apenas nos livros. Ao contrário, em 1940, integrou a primeira turma de recenseadores do Norte do Paraná, trabalhando numa região que hoje - mostra no mapa - corresponde a quase 100 municípios. Foi um aprendizado de todo um Novo Paraná que nascia no ciclo do café. Por três anos, Samuel viveu a experiência fascinante de ver a colonização do Norte Novo, acompanhando o nascimento de inúmeras cidades, sentindo toda uma pujança marcante. Acabou ficando por algum tempo em Sertanópolis, na qual, como um dos poucos intelectuais naquela época em que a região recebia migrantes de pouquíssima cultura (mas enorme disposição de trabalho) havia necessidade de pessoas com algum preparo para ajudar na Prefeitura, na criação de escolas - enfim na formação das cidades. Samuel foi convocado para inúmeras funções e acabou até sendo delegado de polícia. Desta época também data sua amizade com Anfrísio Siqueira, que foi prefeito e delegado no Norte do Paraná. O Norte, mesmo com todo seu fascínio de ser a região em crescimento, não segurou Samuel, que em 1943, voltou para Curitiba. A noiva, Olga, aguardava sua definição e sua família não via com bons olhos a aventura daquela zona então agreste e desafiadora. Aqui voltando, retornou ao jornalismo - já então em "O Dia", e especializando-se na organização de cooperativas de produtores. Acabou gerente da Federação das Cooperativas do Mate. Por mais de 15 anos ficaria nesta área - do que resultaria, aliás, seu primeiro livro publicado em 1955. - "Tive assim, a sorte de trabalhar e conhecer em dois ciclos da economia paranaense: ver o nascimento do Ciclo do Café - num Novo Paraná - e acompanhar uma época ainda de glória da erva-mate, hoje em decadência - representando economicamente o Velho Paraná. xxx Sem nunca abandonar o jornalismo - tanto do lado econômico como, principalmente, político - Samuel sempre teve a habilidade de acompanhar os homens que se sucederam no poder, mas sem jamais estabelecer relações íntimas - mantendo uma possível independência, "na medida do necessário". Profissionalmente, jamais deixou de prestar sua contribuição a vários governos - aproximando-se bastante, em termos intelectuais, do maior estadista que o Paraná teve, Bento Munhoz da Rocha Neto. Quando Bento foi ministro da Agricultura no governo Café Filho, Samuel o assessorou no Rio - e acompanhou de perto a crise de 11 de novembro de 1955. - "Por coincidência, nove anos depois, também estava no Rio, a convite de outro amigo, o ministro Amaury Silva, do Trabalho, e acompanhei nos bastidores a queda do governo de Jango". Amigo fiel de Odilon de Souza Naves, quando de sua morte, em 1960 (de enfarte, durante um banquete, na Sociedade Morgenau), Samuel transferiu seu apoio para Nelson Maculan, que concorreu pelo PTB, contra Ney Braga. Mesmo com esta clara identificação, Ney foi buscá-lo na Rádio Guairacá - quando ali iniciava um programa radiofônico, de cores oposicionistas - para assessorá-lo no Palácio. xxx Estudioso sempre do passado, Samuel nunca deixou de ter os olhos no amanhã - pois entende que o futuro é a chave da história. - "Só os povos que tem um repositório do passado valorizado, podem olhar para o futuro". Autor de uma obra considerada fundamental - "Formação Democrática do Exército Brasileiro" - premiada em 1956 e que, oito anos depois, ajudou-o a livrar-se de incômodos processos em que era acusado de comunista, Samuel sempre teve uma visão ampla, sem preconceitos, liberta de "ismos" e partidos. Frasista admirável, quando fala da importância da Coluna Prestes, reconhece em seu líder, um herói-mito da história brasileira e acrescenta uma frase a propósito da resistência do Cavaleiro da Esperança, aos 91 anos, ainda rijo e percorrendo o Brasil sempre que convocado: - "Luís Carlos Prestes está assistindo vivo o enterro de sua imortalidade". LEGENDA FOTO - Samuel Guimarães da Costa, um mestre de assuntos paranaenses.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
07/05/1989

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