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Aramis

O som para karaokê e o samba em potpourri

Uma das mais interessantes séries fonográficas existentes na Europa e Estados Unidos é a "Minus One", que na República Federal da Alemanha é editada através da Schott's. Trata-se de elepês nos quais há sempre o espaço vago para um instrumento - retirado o som da mixagem final. Destina-se, assim, aos estudantes e músicos amadores colocarem as gravações em play back e solarem o instrumento que executam (metal, cordas, percussão, teclados, etc.), acompanhados de uma esplêndida orquestra. No Brasil, é raro encontrar os discos da Minus One e as poucas tentativas semelhantes para preencher este espaço do mercado fracassaram. Agora, com a febre do Karaokê - que não deixa de ser a mesma técnica, só que geralmente em ambientes noturnos (bares, restaurantes, etc.) para cantores amadores mostrarem suas habilidades canoras, a Companhia Industrial de Discos teve uma boa idéia: já lançou dois volumes ("Você é o Cantor"), com o subtítulo de "Som Game: acompanhamentos musicais para você cantar ou tocar seu instrumento predileto". Naturalmente, músicas das mais conhecidas - no volume 2, "Fuscão Preto", "Detalhes", "Voa Pombinha", "Aparências", "Fica Comigo Esta Noite", "Caminhemos", etc. estimulando os cantores mais tímidos. Uma brincadeira simpática, com um marketing comercial preciso, que deve ter seqüência com novos lançamentos. xxx Durante os anos 70, a Polygram teve na série "A Big Band do Canecão" um produto de maior sucesso comercial. Convocando músicos e vocalistas e entregando-lhes um repertório de sucessos da época, realizava discos animados, comunicativos, de consumo imediato. Com maior ou menor intensidade, o esquema foi usado por quase todas as gravadoras - sempre numa linha de agrupar em potpourris os sucessos mais conhecidos. Agora, em produção de Hélio Eduardo Costa Manso e Raul Carezzato Sobrinho, com arranjos do grupo "Os Carbonos", a RGE, associada à SBT, editou dois volumes de "Samba Bom Nunca Morre". Uma equipe de homens que conhecem o marketing musical - Costa Manso, Toninho Paladino (responsável por centenas de discos de montagem da Sigla), e Marco Antonio Galvão, selecionaram nada menos que 40 sucessos - a maioria samba - surgidos nos últimos anos, que, agrupados em seis blocos diferentes, soam harmoniosamente. Instrumentistas competentes, sete vocalistas (incluindo nomes até conhecidos como Silvinha Araújo), interpretam, com graça e entusiasmo estes sambas, com um resultado positivo. É o tipo do disco para animar festas, tocar em discotheques - enfim ter uma audição animada e coletiva. Um disco de astral elevado - etílico até - para um fim específico. Assim como "Você é o Cantor", da CID, funciona na linha Karaokê, "Samba Bom Nunca Morre" é um disco para substituir a música ao vivo, no embalo festivo. xxx Mulata bonita e simpática, Carmen Silva está na categoria das cantoras brega, prejudicada sempre por um repertório limitado em termos artísticos mas reconheça-se, com grande aceitação popular. Como Núbia Laffayete ou Ellen de Lima (por onde andará?), Carmen chega a uma faixa específica de consumidores, que há tempos, aliás, aguardavam seu novo disco. E ele acontece agora ( "Fofurinha", RGE/SBT), no mesmo esquema dos anteriores: arranjos padronizados e um repertório falando em traições, amores perdidos e reencontros, com músicas de Geraldo Nunes ("Tremelique", "A Felicidade Existe", este em parceria com Sócrates; "O Destino nos Separou", com a participação da dupla Chrystian & Ralf); "Do Seu Mundo Fiz O Meu" (Meireles); "É Sempre um Começo" (Martinha) e até um êxito sertanejo ("Retalhos de Amor", José Fortuna), ao qual Carmen dá uma interpretação diferente. Para o seu público, um disco de vendagem certa... xxx Pesquisador sério da música rural/rurbana, Edilson Leal, da "Folha de Londrina" - e que nesta semana, no Rio de Janeiro, participou do IV Encontro de Pesquisadores da MPB (na qual também estivemos, ao lado de Alceu Schwaab e Luciano Lacerda, pela bancada do Paraná), há anos se preocupa em estudar as relações da realidade brasileira e a música dita sertaneja/rural. Afinal, nesse gênero musical que a partir de 1929 passou a se constituir num dos filões mais lucrativos da indústria fonográfica há todo um manancial para ser estudado e interpretado. Independente de posições estético-artísticas, preconceituosamente colocadas contra os artistas rurais/rurbanos, em suas propostas simples, há em centenas de letras a presença do social - como é sentido pelo homem do campo, pelo agricultor expulso da terra, do interiorano que vem engrossar as fileiras de favelados e miseráveis das grandes cidades. Por exemplo, numa faixa do LP de um novo grupo vocal lançado recentemente pela Continental - o Trio Maravilha, encontramos a "Canção do Bóia-Fria", de autoria de Teixeira (cognominado "O Coronel do Sertão") e Roquinho, que embora sem ter a profundidade que o tema requer, coloca algumas das condicionantes que motivam este problema social de nossa época. O mesmo Trio Maravilha interpreta também "Passarinho Prisioneiro" - mas que não é o clássico do repertório de Nhô Berlarmino (Salvador Graciano, 1920 - 1984), embora o autor, Lazinho Pinto, tenha abordado a mesma temática ecológica. xxx Baiano de Salvador, buscando um espaço na música regional, Carlinhos Marabá tem um LP editado pela Lança (distribuição nacional Fonobrás), com produção de Jairo Pires e Marcus Pitter, especialistas nesta faixa de produtos. Sem pretensões maiores - afinal, não teve influências de rock, reggae ou mesmo de raízes afro - Carlinhos Marabá neste "Pra te ver sorrir" se limita a interpretar composições (a maioria dele próprio) de extrema simplicidade. A faixa de encerramento, "Motorista de Caminhão" (Dell Rosso/Andrade) busca o mesmo filão que até Roberto Carlos explorou em seu disco de 1984: os caminhoneiros, que pelas estradas afora, consumindo muita fita gravada, naturalmente garantem o êxito para os cantores que falam de sua vida, seus amores e seu solitário - mas importantíssimo - trabalho.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
27
09/03/1986

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