Login do usuário

Aramis

O Som do Carnaval (IV) - Auto-suficiência, um sonho muito distante

Glauco Souza Lobo, presidente da Comissão de Carnaval e futruro secretário de Turismo, considera que o desfile deste ano - hoje e amanhã, na Marechal Deodoro, será o mais importante de todos já realizados. Razão: dos resultados obtidos será feita a reclassificação, com as seis primeiras escolas integrando o chamado grupo A e os seis seguintes caindo para o grupo B. Por isto, batizou a festa como "Carnaval da Reorganização". Uma pequena escola - desde que organizada e mostrando competência em matéria de samba - poderá ocupar um espaço melhor, retirando as paquidérmicas agremiações que, fundadas há 20 ou 30 anos, vêm decaindo a cada ano. Aliás, a mais antiga da cidade, a Colorado, dirigida pelo bom percussionista Maé da Cuíca, este ano nem estará competindo devido a não ter conseguido cumprir as condições exigidas pela comissão organizadora. xxx Sete escolas receberam Cr$ 23.500.000 de ajuda oficial: Portão I, Não Agite, Embaixadores, Sapolândia, Deu Zebra no Batuque, Dom Pedro e Mocidade Azul. Sete outras ficaram com Cr$ 16.500.000: Garotos Unidos, Unidos de Colombo, Imperadores Independentes, 13 de Maio (fusão da 13 Ases e Unidos da Princesa), Leão de Ouro e Ideais do Ritmo. Para 8 blocos foram dados Cr$ 11.500.000 a cada um. Ainda está longe o dia em que as escolas de samba da cidade consigam auto-suficiência. Curiosamente, enquanto as mais antigas e tradicionais vivem à sombra de entidades - a Não Agite sob as asas do Coritiba FC, a Mocidade Azul com patrocínio do Pinheiros - duas das mais pobres e humildes agremiações conseguiram estruturar-se nos últimos anos. A Garotos Unidos, da Vila Oficinas, presidida por Alaerson Wenceslau Cabral (Laé), 31 anos - também dirigente da Associação das Escolas de Samba - é a única que tem quadra própria para ensaios. A Deu Zebra no Batuque, presidida por Dirceu Dotti - mas onde quem manda mesmo é a sua mulher, a rigorosa dona Léa - também vem estruturando de forma séria, como conta o veterano Julinho da Adelaide (Julio de Souza, 38 anos), carnavalesco desde 1953 e ex-dirigente dos Acadêmicos da Sapolândia - hoje o lugar-tenente de Glauco Souza no comando do Carnaval curitibano. Ao contrário do que acontece no Rio de Janeiro e São Paulo, até agora nenhuma escola de samba de Curitiba conseguiu o patrocínio de um mecenas da marginalidade bem sucedida. O famoso Afunfa (Osvaldo Fernandes, 44 anos), próspero corretor zoológico que dirigiu a Mocidade Azul durante seu período de glórias, deixou Curitiba há 4 anos e após uma passagem por Porto Alegre está hoje em intensas atividades comerciais em Cuiabá. Seu afastamento do Carnaval curitibano rompeu, ao menos oficialmente, a única ligação que os sambistas tinham com os corretores zoológicos da cidade. xxx No Rio, hoje, as escolas de samba, transformadas em verdadeiras empresas, caminham para uma auto-suficiência e lucratividade. Em sincero artigo ("Revista de Domingo", Jornal do Brasil, 26-01-85), Paulo Andrade, 35 anos, engenheiro, presidente de honra da Mocidade Independente de Padre Miguel, filho do patrono Castor de Andrade - um dos maiores bicheiros do Rio de Janeiro, revelou dados seguros sobre as 15 associadas da Liga das Escolas de Samba. Este ano, só com a venda de ingressos, a Riotur vai faturar Cr$ 60 bilhões, o que somado aos direitos de televisionamento e merchandising deve chegar aos Cr$ 100 bi. "Com este dinheiro - diz Andrade - ela paga todos os coretos, todos os bailes e ainda fica com uma boa reserva, porque não gasta nem 12% desse total com as subvenções. Mesmo assim, comparando com o que recebemos no ano passado - Cr$ 180 milhões - os Cr$ 800 milhões pagos a cada uma das 15 do primeiro grupo já significam um ganho real." Nos anos 70, as escolas de samba do Rio recebiam de subvenção apenas 10% do que gastavam. Hoje a subvenção gira em torno dos 40% e somando os lucros obtidos com os direitos pela gravação do disco - Cr$ 30 milhões - a propaganda da Caixa Econômica na camiseta dos empurradores de alegorias - Cr$ 250 milhões - e a propaganda da contracapa dos discos - Cr$ 120 milhões - cada uma das 15 escolas já tem garantidos Cr$ 1 bi e meio, o que equivale ao que muitas vão gastar no Carnaval. "Isso significa - garante o filho de Castor de Andrade - que num prazo de 3 anos, a figura do patrono tende a desaparecer. No máximo, eles continuarão adiantando dinheiro para manter o fluxo de caixa." xxx O orçamento da Prefeitura de Curitiba para o Carnaval deste ano é de Cr$ 500 milhões - ou seja, quase a metade do que ganha cada uma das 15 escolas do primeiro grupo no Rio de Janeiro. Só que o Carnaval é a mais lucrativa forma de arrecadação do Rio de Janeiro, em termos de turismo, justificando-se o investimento feito pela Riotur. Pouco a pouco, algumas empresas começam a acreditar no Carnaval curitibano. A Petrobrás e Batistela bancaram a iluminação especial. A Brahma vai gastar mais de Cr$ 100 milhões pagando a sonorização da Avenida Marechal Deodoro. Empresas menores também estão colaborando em outras despesas. Mas nem os mais otimistas carnavalescos acreditam que a festa se torne auto-suficiente. "Talvez lá pelo ano 2000" diz Julinho da Adelaide, coçando os fios que lhe restam de sua outrora negra cabeleira.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
08/02/1986

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br