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Aramis

O livro de arte internacional que a Catedral está perdendo

Depois de passar quatro meses em Curitiba e investir US$ 12 mil de recursos próprios para desenvolver um projeto que poderia dar uma projeção visual internacional ao Paraná - especialmente divulgando imagens da nossa Catedral Metropolitana, o fotógrafo Waldir Cruz, 38, Bicho do Paraná focalizado no projeto de valorização promovido pelo Bamerindus há anos, retornou ontem para Nova York. Embarcou decepcionado e amargurado pela falta de apoio para realizar um projeto que, há alguns meses, chegou a ter o estímulo de várias personalidades inclusive o prefeito Jaime Lerner, a quem preparou um jantar no apartamento de um amigo de Nova York, numa das muitas viagens que o alcaide e a esposa Fany tem feito, quase que mensalmente, a Big Apple - para lá visitar a filha Andréa. xxx Jaime Lerner conheceu as excelentes fotografias que Waldir Cruz vem executando nos Estados Unidos, nos últimos anos, trabalhando com alguns dos nomes mais respeitados da área e empregando técnicas originais. Embora não tivesse se entusiasmado com a idéia de um livro-de-arte exclusivamente com fotografias sobre a Catedral Metropolitana, prometeu, entretanto, apoiá-lo para tentar conseguir patrocínio e oferecer a tênue possibilidade de que fizesse um trabalho de documentação em Curitiba. Profissional que aprendeu a desenvolver projetos temáticos, que exigem profundas pesquisas e identidade com o tema abordado - e que o fez se interessar pela idéia de mostrar, em imagens originais a extremamente bem trabalhadas a Catedral de Curitiba (cuja documentação iconográfica é das mais pobres), Waldir recusou, de princípio, a sugestão de Jaime para um projeto com o qual não se identifica, mas se animou que com o prestígio e boa vontade do alcaide mais conhecido internacionalmente, o seu work in progress pudesse ter andamento. Coincidindo com o agravamento da saúde de seu pai, Valdomiro Cruz, falecido há poucos meses, aos 57 anos, Valdir estendeu sua temporada curitibana quando aqui chegou. Procurou Jaime, que o encaminhou a uma de suas mais bem remuneradas consultorias, que apesar de recebê-lo gentilmente, não se entusiasmou com o projeto. Dirigiu-se a outros setores, falou com diferentes "assessores" e só da parte de Mônica Rischbietter, filha da falecida Grandetti e do ex-ministro Karlos Richbietter, encontrou entusiasmo. Entretanto, por enquanto só entusiasmo, o que o fez deixar a seu cago os detalhes do projeto, já que junto aos outros "assessores" (?) de Lerner - inclusive as bem remuneradas firmas que trabalham para a Prefeitura na área de projetos especiais (sic) não sentiu, sinceramente, sensibilidade e compreensão para o alcance de seu trabalho. xxx Pelo seu curriculum profissional e, sobretudo disposição de trabalho - que detalhamos em texto nesta mesma página - principalmente a disposição de elaborar uma documentação que transformada em livro, edição bilingüe (ou mesmo com textos também em espanhol e francês) poderia ter a maior importância dentro do pretensioso programa alusivo aos 300 anos de fundação de Curitiba, que, em termos editoriais, até hoje foi prejudicado pela politicagem e limitação cultural da pessoa que Lerner havia imposto na presidência da comissão. Agora, tentando aparar as muitas arestas que o seu antecessor criou e, especialmente, falta de objetividade e planejamento, a professora Cassiana Lícia Lacerda Carolo, a quem se deve o melhor programa editorial oficial já desenvolvido no Paraná (administração Luís Roberto Soares, 1979/83), vem procurando realizar realmente edições, eventos e efemérides à altura da importância dos 300 anos de fundação de Curitiba. Infelizmente, mesmo com boa vontade, os recursos que existiam foram comprometidos em discutíveis "iniciativas" da "presidência" anterior, Cassiana está com as mãos atadas, o que a impediu de poder dar a Waldir Cruz o apoio que, inteligentemente, sentiu que mereceria. xxx A revista "Vejinha", há três semanas, destacou a importância do trabalho que Waldir Cruz pretendia fazer em Curitiba. Utilizando uma máquina estilo tradicional, que exige tripé, para obtenção de negativos no tamanho 18x24 centímetros, e cuja revelação, submetida a um sistema de imagens típicas das fotografias entre 1870/1900, o trabalho de Waldir é lento, caro e, para conseguir os ângulos que busca, necessitaria, do auxílio do Corpo de Bombeiros para fazer fotos dos pontos mais altos da Catedral, inclusive ao lado externo. Apesar de não ter podido desenvolver esta parte, executou - utilizando os caros negativos e aqui revelando parte do material - cerca de 250 imagens, das mais belíssimas - como constataram todos que tiveram oportunidade de apreciar algumas reproduções. - "Estou levando todos os negativos para os Estados Unidos, inclusive porque a tecnologia de revelação e obtenção da segmentação e tratamento em preto-e-branco, com um proposital "envelhecimento" das fotografias só é possível em poucos laboratórios americanos". O projeto inicial seria elaborar uma média de 400 imagens, das quais num processo extremamente seletivo, seriam selecionados de 35 a 45 imagens para um livro-de-arte, cuja produção editorial, "obviamente terá requintes especiais". Experiências a respeito, em projetos de idêntico esmero, já tiveram a participação de Waldir (ver texto anexo) e uma obra como esta, "seguramente atingiria o mercado classe "A" em dezenas de países". Acrescenta: - "Veja que bela promoção cultural e mesmo turística seria dada a Curitiba". A discussão da arquitetura da Catedral metropolitana - cuja relativa "juventude" (se comparada a outros templos do mundo) e mesmo estética, não invalida, em absoluto o seu projeto. - "Ao contrário, é uma prova de como a partir de uma construção relativamente modesta arquitetônica - mas que é o símbolo-marco da capital paranaense - pode-se produzir um trabalho de arte. O publicitário e editor Orestes Woestelhoff, que inicialmente associado ao designer Oswaldo Miranda na "Casa das Idéias", produziu excelentes trabalhos gráficos - inclusive o álbum iconográfico-histórico sobre o Palácio Avenida, e que agora, criando sua própria editora, tem vários projetos editoriais de primeira categoria, entusiasmou-se com as fotografias de Waldir Cruz. Infelizmente, já encontrando dificuldades para desenvolver projetos anteriores - inclusive um belíssimo livro com a obra do pintor Guiado Viajo (1898/1971) - que há mais de 5 anos espera patrocínio (apesar de toda admiração que o artista italiano tem em Curitiba, cidade em que viveu quase toda sua vida), foi um dos poucos profissionais a tentar auxiliar Waldir, encaminhando-o aos setores em que acreditava pudesse serem sensibilizados. Infelizmente, o esforço nada adiantou. xxx Radicado há 14 anos nos Estados Unidos, onde, a custa de seu esforço e talento, vem conquistando um merecido espaço como fotógrafo de primeira categoria, Waldir pensava que, na capital do Estado em que nasceu, encontraria um pouco de apoio para um projeto sério - de custo compatível, obviamente, com a importância da realização do trabalho ("mas dentro de uma tabela real, no qual, a minha remuneração seria mínima", garante, disposto a provar o orçamento na ponta do lápis). Infelizmente, até o momento, apesar de, aparentemente, receber elogios, de concreto, ou ao menos com alguma base para justificar que continue a investir seu tempo e recursos pessoais, nada aconteceu. Assim, nesse final de semana, já está novamente em Nova York, "onde há uma concorrência maior, um rigor imenso, mas sobretudo respeito e chances reais a quem apresenta projetos sérios - e que não aceita apenas a politicagem e a demagogia aparentemente cultural".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
05/07/1992

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