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Aramis

O jazz com Sony, Mingus e Desmond

1988 parece que será realmente um ano riquíssimo em termos de jazz. Afora as boas temporadas já realizadas e o apetitoso leque de atrações que as irmãs Silvinha e Monique Galdesberg montaram para a próxima edição do Free Jazz (setembro, São Paulo/Rio), os lançamentos de qualidade sucedem a cada semana, tornando difícil mesmo os mais endinheirados colecionadores acompanhar todas as edições. Enquanto a CBS coloca nas lojas um novíssimo pacote com álbuns de Harry Cornick Jr., Wayne Shorter, dupla Harrison-Blanchard e Braford Marsalis, e WEA completa os sete álbuns da Atlantic Rhythm and Blues (1947-1974) - depois da belíssima coleção Atlantic Jazz (com nove volumes) e traz o novo disco dos bluesman Robert Cray ("Who's Been Talkin") e de quebra oferece dois outros documentos no mesmo gênero - Howlin'Wolf e Muddy Waters. Assim, a poderosa BMG/Ariola (antiga RCA), detentora de um dos melhores catálogos internacionais de jazz, também se animou a entrar na praça para esta faixa de consumidores e não poderia começar de melhor forma. Selecionou três estrelas dos anos 50, duas já falecidas, para produções esmeradas, com belíssimas capas, seleção e textos do curitibano Roberto Maggiatti, um dos brasileiros que melhor conhece jazz (e música contemporânea) no Brasil, editor da "Manchete" e autor documental de vários livros. O álbum mais documental deste pacote é "New Tijuana Moods" - precursor da fase espanhola ("Sketches of Spain", Miles Davis), gravado há 31 anos, mas que mesmo nos EUA só foi lançado em 1962. Traz o baixista e compositor Charles Mingus (1922-1979) numa fase de grandes conflitos pessoais e que se refletiu numa música feita a "frente de um hepeteto de desestruturar catedrais", como acentuou Tárik de Souza. Numa de suas separações familiares, o gordo Mingus foi para Tijuana, no México, para esquecer na base da tequila a dor-de-cotovelo. Junto levou o então recém-contratado baterista Danny Richmond - e entre muitos porres - nasceram as idéias para este álbum de alta voltagem no qual Mingus trabalhou em temas inspirados pelas circunstâncias. Assim, "Los Mariachis" tem as dissonâncias de Jimmy Knneper (tronbone), de Curtis Porter, Shafi Hadi (sax alto) e Clarence Shaw (trompete). "Isabel's table dance" teve a participação de até castanholas executadas pela dançarina Ysabel Morel e "Tijuana gift shop" é outro momento original - em contraposição ao clássico "Flamingo" ou uma recomposição de um tema de Dizzy Gillespie ("Dissy's Mood") um dos mais belos momentos do disco. No mesmo ano em que "The Tijuana Moods" foi para as lojas (1962), reaparecia fonograficamente um dos mais criativos sax-tenor do jazz contemporâneo, Sonny Rollins, novaiorquino, hoje aos 59 anos, que por pirações mil havia se afastado dos planos no auge de seu sucesso., "The Bridge" era o ponto de retorno de um dos mais originais criadores do jazz moderno. E "The Bridge", na gravação de 30/1/62, com Jim Hall na guitarra; Bob Craschwa no baixo e Harry S. Saunders é uma das faixas mais interessantes do duplo "The Quartes - featuring Jim Hall". Com esta mesma formação, Sonny gravou outros temas intensos como "God Bless The Childs", enquanto com a substituição de Ben Riley na bateria foram os registros de "Do You Something to Me", "Where Are You" e "My Ship". Marcante, antes de tudo, a suavidade do guitarrista Jim Hall, sugerindo mesmo um acento rítmico de João Gualberto em "The night has a thousand eyes". Mas dos três lançamentos jazzísticos da BMG/Ariola, o mais suave, e enternecedor é "Late Lament" com saxofonista Paul Desmond (Paul Emil Breintenfeld, 1924-1977), nome associado sempre a Dave Brubeck e, cujo quarteto trabalhou por 17 anos. Dono de uma sonoridade esplêndida, suave, camerística, Desmond foi vencedor da maioria dos polls de sax alto nos anos 50/60 e sua musicalidade espraia os momentos de maior ternura jazzística. Em sessões realizadas entre setembro/outubro de 1961, trabalhando com Jim Hall, Gene Cherico (baixo), Connie Kay (do Modern Jazz Quartet) e até um harpista (Gene Bianco) produziu momentos do melhor jazz camerístico - daqueles que se deguste auditivamente como o melhor manjar - em temas clássicos ("My Funny Valentino", "Body And Soul", "I've Got You Under my Skin"), ao lado de composições, que dão título a este álbum absolutamente indispensável: "Late Lament".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
17
19/06/1988

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