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Aramis

O cinema bruxo de Buñuel em cartaz

Três filmes de Luiz Buñuel, diretor espanhol morto em 1983 e um dos mestres do cinema, configuram-se como a melhor opção enquanto o cinema artístico-cultural durante este primeiro mês de 1990, janeiro, em Curitiba. O primeiro destes três filmes programados para janeiro é: "O Anjo Exterminador", que Buñuel rodou no México em 1962, e já consagrado como um clássico de cinema. Está em exibição no Cine Ritz, devendo permanecer até amanhã com cinco sessões diárias. Dia 25 é a vez de "A Ilusão Viaja de Bonde", de 1953, que entrará em cartaz normal no Cine Groff, também com cinco sessões diárias. Depois virá no mesmo cinema "Simão do Deserto", realizado em 1965. Nascido em 1900, Buñuel foi aluno dos jesuítas, e sua revelação para o cinema ocorreu em Paris, na década de 20. Nesta época a capital francesa vivia um período de grande efervescência cultural, quando os então chamados experimentos artísticos que logo repercutiriam em todo o mundo como o surrealismo, agitavam os meios intelectuais da Cidade Luz. Buñuel então integrou-se na convivência com estas vanguardas e com Salvador Dali realizou "O Cão Andaluz" (1928) e que pode ser tomado como a fundação do surrealismo no cinema. E pode-se dizer mesmo que Buñuel, ao longo de sua carreira, manteve-se fiel aos postulados deste movimento, já que a sua criação cinematográfica abre mão dos esquemas rígidos da racionalidae para construir emoções a partir da associação de idéias, em que não conta muito a objetividade tida como tal, mas sim os terrenos ou as propriedades insondáveis do inconsciente humano. No campo do cinema Buñuel levou estas experiências às últimas conseqüências e "O Anjo Exterminador", que está em cartaz no Cine Ritz, é um exemplo disso. Um grupo de pessoas pertencentes à alta sociedade mexicana vai a um jantar oferecido por uma família amiga, e tomado por uma força estranha não consegue mais deixar a casa, ao mesmo tempo em que começa a revelar aspectos desconhecidos, e inesperados, de sua personalidade. Estas pessoas finas, que participam da elite cultural da cidade, de repente - e sem motivo aparente - rompem com as regras que as tornam diferentes do homem comum e passam a adotar comportamentos inusitados e depois beirando as raias da selvageria. Tudo é válido naquele estranho confinamento, das paixões inconfessáveis, às atitudes como as de quebrar um violino e seus pedaços serem transformados em combustão para braseiro. Estas cenas, gratuitas, nas mão de Buñuel recebem teor tragicômico para além delas mesmas, ou seja, o clima cinematográfico daí arrancado dá ao filme propriedade dramática, original, única, capaz de permanecer ilesa à corrosão do tempo. De maneira que em essência "O Anjo Exterminador", 28 anos depois, permanece um filme atual. Mesmo porque Buñuel no seu aparente non sense ou absurdo desenvolve, via uma linguagem altamente elaborada, e que só é dele, um cinema com potencialidade o suficiente para penetrar inclusive na psicanálise e extraindo destes meandros, conhecimentos perfeitamente válidos como referencial para a tentativa de entendimento, quem sabe, da natureza humana. LEGENDA FOTOS- Dirigindo entre outros, Fernando Rey, Delphine Seyrig, Stéphane Audran (centro) e Jean-Pierre Cassel, o espanhol Buñuel recria o surrealismo sarcástico que compõe sua obra.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Cinema
8
23/01/1990

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