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Aramis

No picadeiro da vida

A cena poderia fazer parte de qualquer dos sketches humorísticos apresentados todos os fins de semana no Circo Chic Chic, agora no Capão Raso, mas realmente aconteceu, fora do picadeiro, há alguns dias, quando o circo encontrava-se na Vila Hauer. Ao ali chegar, à tarde, Lafayette Queirolo, 44 anos, (de idade e de vida artística), surpreendeu-se ao verificar que amigos do alheio haviam penetrado no local, à noite, e feito alguns estragos. Chamou o Sr. Salvador Antunes de Oliveira, 19 anos, double de artista da companhia e guardião, e perguntou-lhe o que havia acontecido. - Foram três homens, que entraram de madrugada. - Mas você não fez nada? - Fiz. Consegui dormir, apesar de todo o medo que passei. Lafayette não pode deixar de sorrir. A apesar do prejuízo entendeu a posição de Salvador. É que ele - o querido "Polegar", com seus 1,10m realmente não é o que se pode classificar de um guardião ideal. Mas, no palco, vem sendo considerado uma revelação humorística. xxx Na sexta-feira Santa, a encenação da "Paixão de Cristo" chegou a emocionar a família Queirolo e os colegas - num total de 45 pessoas, que participaram da encenação. Comemorava-se, sem maiores solenidades, mas com muito entusiasmo, o cinqüentenário de apresentações do Drama do Mártir do Calvário, pois foi em 1927, quando os irmãos Julian, Otelo e Ricado Queirolo, encontravam-se em São Paulo, que foi feita a primeira montagem. A partir de então, com exceção do longo período em que o circo esteve com suas atividades interrompidas em Curitiba (1965-1976), em todas as Semanas Santas, o "Mártir do Calvário" nunca deixou de ser encenado. Dessas montagens há estórias famosas, hoje integrantes do folclore circense brasileiro. Conta-se, por exemplo, que na década de 40, o artista que faria o papel de Cristo adoeceu e teve que ser substituído às pressas. O substituto era um bom ator mas amigo de bebida e, considerando que durante grande parte da peça teria que ficar "Crucificado", o diretor do espetáculo, o velho Julian Queirolo, exigiu que não bebesse nada antes da encenação. O ator aceitou, com uma condição: para não ficar totalmente a seco, no momento em que pedisse água e o guarda lhe dá fel, como contam os evangelhos, a lança tendo na ponta uma estopa supostamente embebida em fel deveria ser mergulhada em aguardente. O pedido foi atendido, mas o ator-Cristo entusiasmou-se tanto ao sentir nos lábios o gosto da "branquinha" que não resistiu e ao invés de gemer, estampou o maior sorriso e exclamou, tão alto que todo o público não deixou de ouvir: - "Mais fel; Mais fel". xxx Amanhã à noite, no Capão Raso, Lafayette e Sérgio Queirolo, dirigentes do Circo Chic Chic, voltam a apresentar um drama romântico que sempre leva às lágrimas: "... e o Céu uniu dois corações". Mas será no sábado, que haverá a comedia destinada a ter maior público: "O Maluco do Capão Raso". Escrita há 37 anos, pelo velho Otelo Queirolo - o Chic Chic, essa comédia entusiasma o público humilde a partir do título: "O Maluco da..." é adaptado ao bairro em que o circo está e os "cacos" incluem sempre os tipos populares da comunidade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
4
13/04/1977

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