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Aramis

Munhoz da Rocha, a cidade rural que virou fantasma

Uma cidade de características especiais, integrada à zona rural, planejada em forma de curvas de níveis, numa região totalmente nova. Toda uma arquitetura especial, valorizando material econômico, com características especiais e, principalmente, voltando-se à integração do homem à terra. Sonho de algum arquiteto-ecologista pensando neste final de milênio, no qual a qualidade de vida urbana decai cada vez mais e, rousseanamente, há uma busca do paraíso perdido entre o ver e a natureza? Nada disso. Em absoluto. Mais do que um sonho, este projeto chegou a sair do papel e ter um início de implantação no Oeste do Paraná há quatro décadas. Cidade Munhoz da Rocha - Um projeto nascido nas pranchetas do então atuante Instituto de Geografia, Terras e Colonização, que previa uma área tão integrada em serviços urbanos e zona rural que deveria chegar a 100 mil habitantes ao longo de alguns anos e que poderia ter até lotes de 100 hectares - verdadeiras minifazendas para o desenvolvimento da agricultura. De repente, o sonho acabou. O núcleo original foi abandonado, os serviços implantados - como uma pequena central energética, foram removidas, e tudo se transformou em um projeto-fantasma. Só mesmo quem participou do projeto - e assim mesmo, quase se auto-disciplinando para não esquecer este sonho que não deu certo, tem alguma memória daquilo que foi pensado um dia como uma nova e diferente tentativa de colonização na região onde hoje há o município de Corbélia, há pouco mis de 60 quilômetros de Cascavel. xxx Gravando um depoimento para o projeto Memória Histórica do Paraná, o arquiteto Gustavo Gama Monteiro, 65 anos completados no dia 14 de fevereiro, carioca mas há 41 anos no Paraná, surpreendeu a equipe de entrevistadores ao falar da Cidade Munhoz da Rocha, que com seu caráter de cidade planificada, com características especiais e que chegou a ter uma implantação inicial, seria de supor tivesse maiores referências dentro de nossa história. Mas assim como três dos calejados jornalistas que participavam da entrevista confessaram sua surpresa ante a revelação feita por Gustavo Gama Monteiro, a maioria dos paranaenses desconhece detalhes sobre este projeto - aliás, com mínimas referências documentadas, o que tornará difícil, inclusive, um levantamento mais preciso a seu respeito. xxx No início dos anos 50, quando acontecia o boom desenvolvimentista do Norte do Estado, com cidades nascendo a cada ano devido a iniciativa da companhia de colonização que explorava aquela região - fundada nos anos 30, por pioneiros ingleses e absorvida depois por empresários paulistas em Curitiba, o presidente da Fundação Terras e Colonização do Paraná, Djalma Rocha Al Chuery, se entusiasmou com o projeto de se fazer uma cidade no Oeste, com características especiais. Gustavo Gama Monteiro, formado na turma de 1948 na Escola Nacional de Arquitetura, e que havia vindo para Curitiba em 1952, para assessorar ao então prefeito Erasto Gaertner (1900-1953) no nascente planejamento urbano da Capital, passou também a integrar a equipe da FTGP, então um organismo da maior importância. A idéia de planejar uma cidade, naturalmente, o fascinou, no vigor de seus 27 anos, pois o sonho de Brasília só viria a acontecer alguns anos depois - e as cidades que a companhia de Melhoramentos Norte do Paraná fazia surgir no Norte eram preconizados - quase sempre repetindo-se basicamente em suas concepções. Foi dado ao projeto o nome de "Cidade Munhoz da Rocha Neto" - que não identificou apenas o então governador Bento Munhoz da Rocha Neto, mas também ao seu pai, Caetano Munhoz da Rocha, que já havia sido governador. Enquanto em Curitiba, tocava-se dezenas de obras dentro da euforia das comemorações do centenário de emancipação política do Paraná - Centro Cívico, Teatro Guaíra, Biblioteca Pública, etc., no então distante e inexplorado Oeste paranaense, pioneiros abriam estradas, faziam demarcações e implantavam numa das mais ricas regiões do Paraná - que viria a ter o seu boom desenvolvimentista a partir dos anos 60 - a Cidade Munhoz da Rocha. Infelizmente, o projeto não resistiu a mudança de governo. Quando Munhoz da Rocha deixou a administração, se as obras urbanas implantadas, algumas delas inauguradas, ficavam consolidadas, a distante idéia de fazer uma cidade no oeste arrefeceu. O campo de pouso foi abandonado, o sistema gerador de eletricidade transferido para Cascavel - que havia sido elevada a município em 14 de novembro de 1951, mas só instalado oficialmente um ano depois (dezembro de 1952) e houve uma natural ocupação de terras, riquíssimas e valiosas, por grileiros. Começava um surto de conquista daquela região na base da lei do mais forte, com grilagens de terras, vindas de aventureiros de várias partes - e o que poderia, refletir-se na consolidação na nova cidade, teve uma curiosa conseqüência: o espaço urbano foi praticamente dividido em fazendas, enquanto crescia o distrito de Corbélia, que desmembrado do município de Cascavel, só ganharia autonomia quase dez anos depois - em 8 de dezembro de 1961, trazendo apenas uma referência ecológica: todas as ruas, na época, tinham nomes de flores. Da experiência da Cidade Munhoz da Rocha, ficaram alguns poucos sinais, "mas tão pequenos que só quem participou do projeto é capaz de ter alguma lembrança", diz o arquiteto Gama Monteiro, com um toque de nostalgia. LEGENDA FOTO - Gustavo Gama Monteiro: o projeto de Cidade Munhoz da Rocha, um sonho que morreu.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
21/04/1990

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