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Morte sem medo no livro de Maranhão

O professor José Luiz de Souza Maranhão, da Universidade Católica do Paraná, acaba de lançar nacionalmente um livro com tema dos mais inquietantes: "O que é morte". Trata-se de um ensaio que focaliza com categoria o fenômeno da morte sob vários ângulos: antropológico, político, psicológico e filosófico. José Luiz Maranhão, 30 anos, intelectual reconhecido e respeitado na comunidade universitária brasileira pelas inúmeras conferências proferidas e pelos artigos publicados em revistas especializadas, explica que a atualidade do ensaio, "a respeito de um tema tabu", foi ampliada com a doença do presidente Tancredo Neves, com o fim de agonia da norte-americana Karen Ann Quilan e com a divulgação das muitas vítimas da Aids. Bacharel e licenciado em Filosofia, e também habilitado em Psicologia e História, pela Universidade Federal do Paraná, Maranhão fez pós-graduação em Teorias Sociológicas e em Filosofia das Ciências Humanas. No momento, prepara a defesa da tese "A negação da morte no Ocidente: uma abordagem interdisciplinar", a ser defendida na PUC-São Paulo. O editor Caio Graco Prado, da Brasiliense, sabendo das pesquisas e estudos de Maranhão, nessa área, convidou-o para escrever um volume na série "Primeiros Passos" (n. 150, 77 páginas, Cr$ 7.500). xxx A morte, única certeza na vida, é quase sempre tratada em tom solene, pesado, temeroso. José Luiz Maranhão (professor de Filosofia, História da Filosofia Medieval e Moderna, Deontologia e Ética da PUC) aborda, entretanto, o tema de forma crítica e provocante, discutindo questões importantes como a "repressão da morte" na sociedade capitalista, a abreviação e o prolongamento da vida, as concepções filosóficas a respeito do morrer e o tabu da morte como estratégia para mascarar o sistema de injustiças sociais. Assim, o primeiro capítulo ("Não se morre mais como antigamente"), com sutis e delicados toques de humor, vagamente macabro, como o tema sugere, embora adequadamente contido, como o bom senso recomenda, prende a atenção do leitor logo de cara. Ali se analisa o desencontro do homem contemporâneo com a morte e o estabelecimento de um novo tabu: "à medida que a interdição em torno do sexo foi se relaxando, a morte foi se tornando tema proibido, coisa inominável. A obscenidade não resiste mais nas alusões às coisas referentes ao início da vida, mas, sim, aos fatos relacionados com seu fim". O segundo capítulo, "A desigualdade dos homens diante da morte", chama atenção para o fato de que "o significado do fenômeno da morte não se esgota em sua dimensão natural ou biológica. Ela comporta, também, como qualquer fato da vida humana, uma dimensão social e, como tal, representa um acontecimento estratificado. Todos morrem, é certo; contudo, a duração da vida e as modalidades do fim são diferentes, segundo as classes a que pertencem os mortos". É enfatizado, também, o genocídio no Terceiro Mundo, a miséria dos sertões, a desnutrição "de cada mil crianças nascidas no Brasil, 100 morrem antes de completar um ano, sendo que em alguns Estados esse número chega a 240". O terceiro capítulo, "Humanizando a morte", defende o direito básico de todo homem poder viver os últimos e decisivos momentos de sua existência do modo mais digno, respeitoso e humano possível. Assinala "o fato de que os hospitais, na medida em que são providos de todos os recursos médicos e técnicos especializados, são os menos adequados para oferecer aos moribundos o auxílio de que precisamos" . Trata, ainda, dos estágios de adaptação psicológico-emocional pelos quais passam os pacientes terminais e dos delicados problemas éticos da abreviação (eutanásia) e do prolongamento (distanásia) da vida humana. Observe-se que esse último problema cresceu em atualidade com a doença do presidente Tancredo Neves e o fim da agonia da norte-americana Karen Ann Quilan. O último capítulo, "O homem: ser para a morte", introduz questões filosóficas, tal como a importância e a necessidade da reflexão sobre a importância e a necessidade da reflexão sobre a morte para a própria vida: "Só podemos viver intensamente e apreciar a vida se nos conscientizamos de que somos mortais (...). A consciência da morte revela a insignificância do acúmulo de posse e dos cuidados cotidianos, dos quais se é freqüentemente escravo". Em síntese, José Luiz de Souza Maranhão escreveu um ótimo intróito para a discussão ampla do tema, tudo através de vários enfoques. Quem se interesse pela vida, tem que ler essa obra.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
06/09/1985

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