Login do usuário

Aramis

A lírica enxuta de Luci e o schoolar Hélio Puglielli

Um curriculum invejável. Aos 27 anos, a curitibana Luci Collin já fez tudo que era possível a uma jovem intelectualmente ansiosa - e dentro dos padrões de bom comportamento - realizar. Formada em música pela EMBAP (1985), Português-Inglês pela UFPR (1989), um curso de percussão completado no ano passado, faz atualmente pós-graduação em Língua Inglesa, já morou nos Estados Unidos, freqüentando cursos no Wright State University, em Ohio, há quatro anos e seu inglês é tão bom que lhe valeu o certificado da Universidade de Cambridge. Literariamente, já colecionou prêmios em concursos realizados em Brasília e Curitiba, inclusive um primeiro lugar no concurso de literatura Bertold Brecht (1987) e uma menção honrosa no Prêmio Paraná - Concurso Nacional de Contos em 1988. Como percussionista, já tocou com a OSINPA, além de integrar grupos diversos. Com visão empresarial, chegou a fundar uma firma - Astarte - para empreendimentos culturais e, entre 1984/85 tentou fazer com que uma cooperativa de artes deslanchasse. Seu primeiro livro de poesias ("Estarrecer", 1984) teve boa acolhida e, diversificando suas atividades literárias, tentou também o teatro, fazendo roteiros para os espetáculos "Shumann Traduzido" (Paiol, junho/84) e "Chopin - Tempo e Obra" (auditório da UFPR, 1985). Agora, com uma linguagem mais trabalhada, buscando mesmo uma aproximação concretista, Luci Collin publica "Espelhar" (série Textos Agora, Secretaria da Cultura, 84 páginas, março/91), que pode, sem favor nenhum, ganhar distribuição nacional. Liberta de qualquer ranço provinciano, numa linguagem extremamente bem burilada - e que demonstra sólidas e positivas influências, reflexo por certo de muitas e atentas leituras de mestres do Brasil e Exterior (especialmente da língua inglesa), Luci Collin - além de tudo uma bela morena, capaz de ela própria ser musa de corações apaixonados - traz poemas para leitura e reflexão. Eliminando, o quanto possível, os artigos dispensáveis, trabalhando a palavra como o polimento de uma pedra, sua proposta lírica é jovem, moderna e cortante - vai fundo na razão - antes do coração, a partir de um dos primeiros textos com que abre este seu "Espelhar": "A ampla porção sem nome / se esconde Nos rostos tantos / se encontra Diamante gelo fingindo Chicote ao mais leve / toque" Com capa e ilustrações de Vera Andrion, "Espelhar" é um livro exemplar de uma poeta que parece saber o que quer dizer - e que longe de tertúlias sedimenta na firmeza das letras uma visão nem sempre risonha, muitas vezes - mas sempre sincera - de seu mundo. xxx Obra póstuma de um jovem precocemente desaparecido, Paulo Roberto Bittencourt Teixeira (1965-1990), "Auto Retrato" (132 páginas, capa de Adilson Salvi, Secretaria da Cultura do Paraná, março/91), é um livro emotivo, por trazer a visão do mundo, em forma de poesia, de "uma voz de quem estava quotidianamente se defrontando com limitações orgânicas e com padecimentos físicos de extrema gravidade", como, sensivelmente, Hélio Fileno de Freitas Puglielli, observa no prefácio. É Hélio quem, com sua autoridade de poeta e ensaísta, diz: - "A leitura das poesias de Paulo Roberto deve ser conduzida no sentido de valorizar textos escritos em condições adversas e onde se revela surpreendentemente um horizonte espiritual incomum". xxx Além de prefaciar "Auto Retrato" e "Ontem Agora", Hélio Puglielli, 52 anos, comparece duplamente, da forma mais marcante, neste pacote literário do trimestre. Como poeta, oferece uma contribuição destinada a merecer os mais profundos estudos pela dimensão da proposta, no que contém de síntese-filosofia em palavras das mais trabalhadas: "O Ser de Parmênides chama-se Brahma". Ao longo de 55 "momentos" - caberá aos críticos definirem se deve se chamar de cantos, estrofes ou outra designação - num livro de apenas 18 páginas, com belas ilustrações de Jussara Topolski - Hélio coloca uma espécie de síntese minimalista de uma cultura acumulada em mais de 40 anos de devorador de livros. Um de nossos (poucos) intelectuais que se pode classificar de um "Schoolar em Progresso" - digno de ser comparado a mestres como Temístocles Linhares e Wilson Martins, Hélio, por sua formação intelectual, pensa não apenas na literatura mas em todo o Paraná. Assim, se neste seu poema-proposta, que pela complexidade (e multiplicidade) de imagens sugeridas exige reflexões muito mais amplas e de críticos que possam entendê-la em sua totalidade, Hélio faz uma espécie de projeto literário, coincidentemente, em outro livro com lançamento simultaneamente ("Para Compreender o Paraná", 86 páginas, Secretaria da Cultura do Paraná), onde dá sua contribuição de crítico, com a visão de jornalista que nunca abandonou a profissão. Redator, editor e nos últimos anos editorialista de "O Estado do Paraná" - de cuja equipe fez parte por quase 30 anos, de uma família de notáveis profissionais da imprensa - neto de Rodrigo de Freitas, sobrinho dos mestres Wandick e João de Deus Freitas Neto, primo de Rodrigo Manoel Marchesini de Freitas (único da família que continua, diariamente, na redação, como editor assistente da "Tribuna do Paraná"), Hélio, ao deixar o compromisso diário com o jornal, não deixou porém de escrever. Entre suas atividades universitárias, integrando a equipe de profissionais que vem documentando a memória paranaense numa série de gravações, Hélio, semanalmente e em diferentes jornais, publica artigos da maior lucidez sobre fatos, coisas e especialmente pessoas do Paraná. Deste já grande material, selecionou 93 textos curtos em sua forma, mas profundos em seu conteúdo - nos quais analisa desde o linguajar paranaense, como faz perfis de personalidades como Bento Munhoz, David Carneiro, Erasmo Pilotto, Ernani Reichman, Sérgio Sossella, Emiliano Perneta, Wilson Martins, Paulo Leminski, Plácido e Silva, Colombo de Souza, Samuel Guimarães da Costa, entre outros. Despretenciosamente, "Para Compreender o Paraná", é um dos mais importantes volumes já editados, pois, numa forma rápida, simples e jornalística, mostra "Bichos do Paraná" que merecem - e devem - ser melhor estudados e, logicamente, admirados. LEGENDA FOTO - Luci Collin: prontinha pra consumo poético nacional.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
24/03/1991

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br