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Aramis

Jards, um coringa da MPB, em grande forma

Uma das melhores notícias deste ano de 1987 foi o retorno à cena de Jards Macalé (Jards Adet da Silva, Rio de Janeiro, 03/03/1943). Compositor, cantor, produtor musical, agitador de eventos, o bom Jards atravessava uma fase pesada, com mil problemas pessoais, o que o fez permanecer afastado dos discos e dos shows. Felizmente, regressa com força total, prometendo fazer nada menos que quatro discos num ano, para recuperar o tempo perdido. O primeiro foi um mix, com uma nova composição - "Rio sem Tom", uma homenagem à Organização Mundial da Saúde e aos cientistas brasileiros e, no outro lado, "Blues Suedes Shoes", "minha homenagem aos grandes roqueiros do mundo", seguido agora de um excelente elepê no qual mostra seu lado de cantor ligado ao que há de melhor em nossa MPB: "4 Batutas e 1 Coringa" (Continental, junho/87). Macalé, criado na Tijuca, de raízes bem cariocas mas que nos anos 60 identificou-se com o grupo baiano ao ponto de muitos o confundirem como nascido na boa terra, é um intérprete romântico. Sempre que pode, sempre gostou de cantar as músicas dos sambistas que tanto admira. É também um dos maiores admiradores do samba-de-breque, amigo pessoal do grande Moreira da Silva, firme e rijo aos 85 anos, com quem, aliás, voltou a dividir shows no Projeto Pixinguinha. Nos últimos anos, Jards havia apenas participado no disco em homenagem a Geraldo Pereira (1918-1955 - Estúdio Eldorado) e num outro, reverenciando Ismael Silva (1905-1978), que a FUNARTE ainda não lançou. Com produção de Sérgio Mello e Sônia Mattos, "4 Batutas e 1 Coringa" traz Macalé como o diabo gosta - homenageando, com todo carinho, belos arranjos divididos entre Júlio Medaglia, Amilson Godoy e ele próprio, quatro geniais compositores populares. Assim, de Geraldo Pereira, gravou o atualíssimo "Ministério da Economia" (parceria com Arnaldo Passos), composto há 35 anos, mas com sua ironia dos tempos de Getúlio mais do que nunca atual ("Seu Presidente / sua excelência mostrou que é de fato / Agora tudo vai ficar barato / Agora o pobre já pode comer"). De Pereira, também é "Bolinha de Papel" (que João Gilberto bossanovizou com tanta classe) e "Acertei no Milhar", parceria com outro bamba da malandragem musical Wilson Batista (1913-1968). O grande Nelson Cavaquinho (Antônio Nelson da Silva, 1910-1986) é lembrado com "Luz Negra", "A Flor e o Espinho" e "Palhaço". O gaúcho que melhor samba fez, Lupicínio Rodrigues (1914-1974) é o terceiro batuta, presente com "Dona Divergência", "Exemplo" e "Torre de Babel". Legítimo sucessor destes grandes ases, o carioca Paulinho da Viola (Paulo César Baptista de Faria, Rio, 01/11/1942), há quatro anos sem gravar - mas que agora voltará aos estúdios (e em agosto estará no palco do Guaíra, felizmente) é homenageado com o seu autobiográfico ponto de partida musical - "14 Anos", o romântico "Pra Ver as Meninas" (Samba Infinito, 1971) e "Vela no Breu", parceria com Sérgio Natureza. Um repertório excelente, Macalé cantando suave e bonito. Arranjos inteligentes - inclusive com a utilização de cordas, como em "Torre de Babel" (como uma combinação de dois violinos, viola, violoncelo e baixo de 5 cordas), "Luz Negra" e "Exemplo" - no qual Medaglia incluiu clarone, clarinete, flauta, oboé e contrabaixo. Já em "Para Ver as Meninas", Jards usou simplesmente o violão, enquanto que "Vela no Breu", superpõe-se ao violão, "a garrafa de cerveja Antárctica vazia & chaves", executada por Luizão e caixa de fósforos por Sérgio Mello. Um belíssimo disco, da melhor MPB. Indispensável!
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
49
09/08/1987

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