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Aramis

História da BN em 3 lps

Dezesseis anos após sua eclosão - o 78 rpm da Odeon, em que o baiano João Gilberto cantava "Chega de Saudade" (gravado em 1958, no lp "Canção do Amor Demais" por Elizeth Cardoso), a Bossa Nova é revisitada num álbum de três elepês, mais um bem diagramado e ilustrado folheto, tudo sobre a produção segura do admirável Aloysio de Oliveira, que se não foi o pai-da-criança BN, foi ao menos quem a ensinou a caminhar sobre as rodas - isto é sobre os discos. "Bossa Nova/Sua História/Sua Gente" (Philips, série super luxo, 929921819/20, Abril/75) está entre os mais importantes lançamentos fonográficos do ano em termos de documentação. Sintetiza momentos marcantes do movimento que provocou uma reavaliação/reaproveitamento da MPB, despertando as consciências adormecidas para a beleza de nossa música popular. Se o movimento teve evoluções discutíveis (tropicalismo, música jovem etc.) o básico permaneceu. E não há ninguém com mais de trinta anos (e menos de cinqüenta) que não admita que aprendeu a gostar e se interessar por toda a MPB, via Bossa Nova. A Bossa Nova merece longos ensaios e não apenas rápidos registros jornalísticos - ou mesmo uma produção documental limitada a uma gravadora e onde, infelizmente, registros importantes - mas feito em outras fábricas (principalmente na Odeon), ocasionam ausências fundamentais. Mas, como informação a uma geração entre os 14/25 anos que não teve a felicidade de descobrir a MPB ouvindo a Bossa Nova - e que em compensação despreza o nosso cancioneiro por simples ignorância - esta edição Philips é realmente fundamental. Para quem acompanhou o nascimento, crescimento e, vamos dizer, acomodamento, da Bossa Nova talvez este álbum não seja tão indispensável, pois se tratam de faixas aproveitadas de mais de quarenta diferentes discos, grande parte, produção do próprio Aloysio de sua etiqueta Elenco. O próprio Aloysio dá um depoimento de como nasceu essa gravadora de tamanha importância na MPB nos anos 60. - Sir Joseph Lockwood, presidente da EMI no mundo inteiro, veio ao Brasil numa viagem de observação. A Odeon era sua subsidiária. Olhando de perto nossas atividades por uns dias, e estudando cuidadosamente a posição de nosso mercado, chega [à] seguinte conclusão (isto foi o início da Bossa Nova): "Vocês estão 50 anos na frente de seu mercado. Ou vocês recuam para um gênero mais popular (ele quis dizer "vendável"), ou vocês procurem se expandir para outro setor". Ora, eu havia bolado um plano, que residia há tempos na gaveta do nosso diretor, para a criação de 2 departamentos para funcionarem junto ao disco. O primeiro era a criação de uma editora (ah, se eles tivessem feito isto, seriam hoje donos de todo o repertório de Antonio Carlos Jobim!). O segundo, seria a formação de uma agência para orientar seus artistas, promovê-los em espetáculos etc. (olha o Marcos Lázaro, etc.). Mas a diretoria achou mais conveniente recuar. Dias depois, recebo uma lista de artistas (considerados não-comerciais), para que eu os dispensasse do elenco da gravadora; entre outros estavam os nomes de Silvia Telles, Sérgio Ricardo, Lúcio Alves, Alaide costa e todos os nomes ligados à Bossa Nova. Eu simplesmente acrescentei meu nome da lista e [demiti] como diretor artístico. Fui então convidado para a mesma função na Philips, onde a minha gestão durou apenas alguns meses. Nesses meses comecei a pensar em criar uma gravadora que continuasse a registrar os trabalhos de compositores e intérpretes, que naquele momento não encontravam um veículo para divulgar os seus trabalhos. E nasceu a idéia da Elenco. Deu muito trabalho; foi uma aventura que alguns consideravam perigosa, mas criada assim mesmo. Sem grande financiamento (somente um pequeno para iniciar as primeiras produções) a Elenco se auto-financiou em poucos meses. Nomes como Antonio Carlos Jobim, Vinicius de Morais, Baden Powell, Sérgio Ricardo, Silvia Telles, Lennie Dale, Trio Tamba, Roberto Menescal, todos aderiram a nova idéia, que provocou o lançamento de novos nomes, como Edu Lobo, Nara Leão, Quarteto em Cy, M.P.B. 4 e muitos outros. Sem contar nos que acreditavam [...] na nova gravadora: Mario Reis, Cyro Monteiro, Araci de Almeida, Sérgio Porto, Billy Blanco. E a Elenco com seus 60 lps, uma gravadora não popularesca, mas popular, e sem a sofisticação que muitos queriam lhe conferir, conseguiu durar 4 anos. E até hoje ainda é por aí relembrada e considerada como um fato importante da nossa Música Popular". O depoimento do próprio Aloysio explica muito sobre a sua contribuição na MPB nestes últimos anos, sem falar em sua atividade anterior (Bando da Lua, Carmem Miranda, etc.). O fundamental é que ele, aos 60 bem vividos e amados anos, continua produzindo obras de gabarito, como esta "BN/Sua História/Sua Gente", onde sintetizou desde os registros de um dos precursores da BN - Mário Reis - até as mais recentes gravações de Tom Jobim ("Ana Luíza") e Antonio Carlos Jobim, "culpado disso tudo" nas palavras de Aloysio. Nos 3 elepês do álbum desfilam Dick Farney (em duelo com Norman Bengel, cantando "Você"), Doris Monteiro, (João) Donaoto e seu trio, Billy Blanco. Os cariocas, Lucio Alves, Elizete Cardoso, Agostinho dos Santos, Leny Andrade, Tamba Trio, Lenita, Bruno, João Gilberto, Roberto Menescal e conjunto, Maysa, Sergio Ricardo, conjunto Oscar Castro Neves, Claudete Soares, Sylvia Telles, Carlos Lyra, Sergio Mendes e Bossa Rio, Nara Leão, Zimbo Trio, Luiz Eça, Quarteto em Cy, Edu Lobo com Tamba Trio, Baden Powell, Vinicius e Toquinho, MPB-4, Os Gatos, Rosinha de Valença, Chico Buarque, Elis e Tom Jobim. É preciso acrescentar mais alguma coisa? Iniciando uma coleção que tem tudo para se transformar em fundamental - "Mais do de Meio Século de Música Popular Brasileira", a RCA Victor apresenta em seu volume 1, correspondente [à] década que vai do histórico "Pelo Telefone" (Donga-Mauro Vasconcelos), em 1917, as "Amar Uma Só Mulher" de Sinhô, em 1928, o grupo 10.001 & Vocal Documenta. Produzido por Waldyr Santos, com arranjos e regências do maestro Elcio Alavarez, a coleção que inicia parece ter boas intenções. Na contra-capa, Sergio Teodoro Gomes faz uma síntese dos mais importantes fatos ocorridos a cada ano. Embora com dados interessantes, preferíamos um texto documental mais extenso, à exemplo dos que o inteligente João Luis Ferreti, secretário-geral da Associação Brasileira de Pesquisadores de MPB, prepara para suas produções na Continental. De qualquer forma, é agradável ver a RCA Victor voltar [à] produção de lps documentais, após ter interrompido (por quê?) as séries "Grandes Intérpretes" e "Documento" que vinha realizando com muito esmero. Na capa, uma foto dos sete elementos de "Oito Batutas", grupo liderado por Pixinguinha, que em 1927 excursiona a Buenos Aires. Faixas: "Pelo Telefone"; 1918: "Patrão, Prenda Seu Gado" (Donga/Pixinguinha/João da Baiana); 1919: "Já Te Digo" (Pixinguinha); 1920: "Pé de Anjo" (Sinhô); 1921: "Essa Nega Que Me Dá" (Caninha); 1922: "Me Leva, Me Leva Seu Rafael" (Caninha); 1923: "Tatu Subiu no Pau" (Eduardo Souto); 1924: "Fubá" (Romeu Silva); 1925: "Nosso Ranchinho" (Donga); 1926.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Jornal do Espetáculo
41
20/04/1975

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