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Garibaldinos decidem o seu destino no dia 30

Sexta-feira, 20, salão de festas da Sociedade Garibaldi. No coquetel em homenagem ao elenco de "La Gata Cenerentola", um grupo de convidados está sentado ao redor de uma mesa coberta com uma toalha branca. De repente, alguém nota que num dos cantos da alva toalha, começam a aparecer alguns pingos pretos. América Guerra, assessora do Departamento do Patrimônio Cultural, da Secretaria Municipal da Cultura, identifica a origem da sujeira: - "É cupim. E em quantidade impressionante que cai do teto". xxx Realmente, era cupim. Numa quantidade tão grade que a olho nu era possível identificar sobre várias mesas - e mesmo no assoalho - do imenso salão. Uma prova definitiva do estado em que se encontra a sede de uma das mais bonitas sociedades, ocupando um ponto privilegiado e que 106 anos de tradição não evitam uma trágica realidade: está a beira da ruína, e não será surpresa se dia destes houver o tombamento - não o histórico-artístico (já feito pela Secretaria da Cultura) mas real, do próprio prédio. - "Garibaldi vai sair da cova e, espada na mão, virá cortar as cabeças dos (ir)responsáveis que permitiram que a sua sociedade chegasse neste ponto" - esbraveja, em seu sotaque siciliano, Giuseppe Loberto, 65 anos, garibaldino apaixonado e que integra como candidato a diretor de relações públicas a chapa "Nova Garibaldi", nas eleições do próximo dia 30 de junho. xxx Se quisessem utilizar uma frase de efeito, os integrantes da chapa oposicionista poderiam adotar o lema: "A última oportunidade: ou a renovação ou a morte da Garibaldi". Entretanto, elegantemente, os membros da chapa oposicionista, todos, nascidos na Itália ou filhos da primeira e segunda geração de "oriundi", estão preferindo uma campanha sem retaliações, embora num corpo a corpo com os 500 associados que poderão votar. Destes, normalmente, apenas 30 a 40% comparecem nas eleições - e motivar justamente que todos participem da assembléia em que será decidido o futuro da enfraquecida sociedade é a maior preocupação de Mário Cochieri, 62 anos, há 35 no Brasil, ex-presidente que encabeça a chapa "Nova Garibaldi". Fundada há mais de um século, com um passado glorioso, dona de um patrimônio valioso - só a localização de sua sede lhe dá uma característica especial, no Setor Histórico, com uma visão que descortina grande parte da cidade - a Garibaldi vive uma crise de muitos anos. Com um quadro associativo que se reduz cada vez mais, cobrando uma mensalidade simbólica (NCz$ 3,00) e uma arrecadação incapaz de cobrir sequer as despesas de iluminação, a sociedade criada pela comunidade italiana em 1883 sofre muitos problemas. Piores daqueles que teve em 1943, quando devido ao fato do Brasil ter entrado na II Guerra Mundial, ao lado dos aliados, a sua sede foi apedrejada e confiscada pelo governo - passando depois, ironicamente, a sediar o Tribunal de Justiça por quase duas décadas. Todos reconhecem o trabalho que Alfredo Ribeiro Sant'Anna, 76 anos, filho de portugueses, desempenhou para que a sociedade não desaparecesse. Foi Sant'Anna, sofrendo perseguições do interventor Manoel Ribas e a hostilidade de muitos, quem preservou o espírito e documentação da sociedade, abrigada por algum tempo na Sociedade de Educação Física Duque de Caxias, até que conseguiu sede provisória. Em reconhecimento ao muito que fez pela Garibaldi, Sant'Anna ganhou uma liderança que lhe garantiu sucessivas reeleições para cargos de diretoria - inclusive a presidência. Infelizmente, argumentam os oposicionistas, Sant'Anna não entendeu que merece todas as honras e homenagens, mas está na hora de passar o cargo para gente capaz de salvar a sociedade de um melancólico final. - "Vamos fazer uma homenagem maior a Sant'Anna, uma estátua de bronze pelo muito que vez pelo clube - mas, temos que renovar a diretoria", diz o advogado Giuseppe Lanzuolo, 54 anos, 39 de Brasil, candidato a vice-presidente. Todos os integrantes da chapa "Garibaldi" não se cansam de enaltecer a honradez e a dedicação do velho Sant'Anna, mas também lembram que nem só de seu idealismo pode sobreviver uma sociedade com a caixa a zero, seu único patrimônio carcomido pelo tempo e que para uma reforma-restauração necessitará de pelo menos NCz$ 500 mil - verba, naturalmente, "que não é fácil de conseguir", argumenta Moacir Visinoni, candidato a secretário geral. As eleições na Garibaldi transpõem os limites de uma sociedade tradicional, pois um grande patrimônio está ameaçado: se não houver uma imediata dinamização para motivar a salvação do imóvel, Curitiba pode perder um prédio histórico. Esvaziada, com um quadro associativo que pouco a freqüenta e dividida por figadais divergências de seus líderes, a sociedade precisa de uma direção segura, com prestígio, capaz de reunir forças vivas - e, especialmente suporte financeiro, que a reconstitua. A oposição escolheu para presidente de honra de sua chapa o industrial Sinibaldo Trombini, bilionário empresário, com prestígio capaz de viabilizar um plano financeiro para que as obras necessárias sejam realizadas a curto prazo - e que também amplie-se o quadro associativo. Mário Cochieri, um italiano sem papas na língua que não esconde suas críticas à situação da Sociedade - e defende um projeto de revitalização da centenária instituição - diz que se dispôs a voltar à presidência "para que meus filhos e netos não me cobrem a omissão". Agora, a maior luta dos candidatos - que inclui inclusive a empresária Ivonette Ceccon, filha do sempre lembrado Orlando Ceccon, que dirigiu a sociedade por muitos anos - estão na luta, para que, democraticamente, se decida, no próximo dia 30, o futuro de uma entidade que é um patrimônio curitibano. LEGENDA FOTO - Sinibaldo Trombini: prestígio para ajudar a salvar a Sociedade Garibaldi.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
24/05/1989

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