Denise, superstar dos anos 90, na conquista da América
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 15 de janeiro de 1990
E a (nossa) estrela Denise Stocklos continua a subir!
Quem não leu o "Jornal do Brasil" da última quinta-feira, 11, ficou sem saber que a mímica iratiense - hoje considerada uma das melhores do mundo - está pela terceira vez fazendo temporada no LaMama, um cult-theater no Greenwich Village, cuja proprietária, Ellen Stewart, apaixonou-se pelo trabalho de Denise e desde 1987 a vem hospedando para anuais temporadas de 30 dias no bairro boêmio e artístico da Big Apple.
A jornalista Vera Franco, correspondente do "Jornal do Brasil" em Nova Iorque, enviou longa matéria - que mereceu toda a última página do Caderno B contando como está indo a iratiense neste seu terceiro reencontro com os novaiorquinos.
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Desta vez, Denise inovou: na peça "Casa" faz "uma exploração poética das reações interiores do indivíduo e das atividades mais corriqueiras do cotidiano humano". Nesse espetáculo, Denise reúne pela primeira vez um elenco de 8 atores, entre eles seus dois filhos, Thias e Piata Stocklos. Vera Franco fala que Denise está comemorando 10 anos de atividades artísticas. Na verdade, é mais que o dobro: em 1968, quando chegou de Irati, tímida mas já com forte personalidade, ela fazia numa sessão coruja no antigo Teatro de Bolso, na Praça Rui Barbosa, a encenação de "Círculo na Lua, Lama na Rua", seu primeiro texto. E não parou mais! Participou de inúmeras encenações ocorridas em Curitiba - especialmente as do grupo Escala, dos bons tempos em que Oracy Gemba (por onde andará?) e Iara Sarmento o faziam uma usina de criatividade. Denise foi a Barbara Heliodora na montagem de "Arena Contra Tirandentes", direção de Gemba, produção de Paulo Sá (hoje próspero homem de vendas) que inaugurou, oficialmente, o Teatro Paiol em termos de artes cênicas em abril de 1972. (antes, Vinícius, Toquinho, Marília Medalha e o Trio Mocotó o haviam inaugurado musicalmente em 27 de dezembro de 1971).
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Voltemos às informações de Denise, hoje internacional. Ela disse a Vera Franco, do JB, que "Casa" tem a sua visão do que será a tônica dos anos 90:
- "A desorganização de todo o establishment político e cultural e a partida para a valorização de cada momento da vida humana, que vem sendo muito descaracterizada pelo capitalismo".
Hoje à beira dos 40 anos, uma vivência internacional que lhe abriu a cabeça, dois filhos, reconhecimento internacional como uma mímica da maior expressão, Denise também amadureceu politicamente. Assim, é natural que Vera Franco tenha escrito no JB que em "Casa", Denise define-se como reflexo de uma posição ideológica e estética totalmente desvinculada de qualquer tentativa de concessões.
- "Acho que nos anos 90, em um Brasil pós-eleições, não é possível mais manter um discurso político de história ou mesmo de antropologia. Quanto mais poético, mais democrático e real é o teatro".
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Em 1988, Denise conquistou elogios - e garantiu casas lotadas (é verdade que LaMama é um mini-teatro) com sua audaciosa visão de "Mary Stuart" - que, aliás, vai apresentar na Filadélfia, após passar 45 dias na Califórnia. No ano passado, com uma produção ainda mais audaciosa que propunha uma revisitação hamletiana de Ir-A-Ti os aplausos reduziram-se. O que, em absoluto, não a desanimou.
Com "Casa" a reação do público (que não chegou a ocupar nem metade do LaMama) tem sido "a mais disparatada possível" na descrição de Vera Franco. "Houve quem passasse a peça inteira às gargalhadas, mesmo nos momentos mais trágicos do cotidiano humano, e quem suspirasse de angústia e tensão". Essa diversidade de humores da platéia já é rotina na vida de Denise.
- "Há trabalhos em que eu fico chorando e as pessoas rindo. Isto não me incomoda. Na realidade, o que me incomoda seria o ator partindo para uma linguagem mais superficial".
Com o seu teatro essencial, Denise propôs uma nova dramaturgia - e tem buscdo fazer projetos abertos a várias interpertações.
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Apesar de legítimo bicho do Paraná, Denise não tem planos artísticos de retornar a Curitiba. No máximo, tem visitado sua família - a irmã Deyse Malucelli, que reside em Curitiba, a mãe e as tias em Irati. Afinal, há alguns anos, sonhou em fazer uma grande encenação de "Mary Stuart", que teria inclusive a possível participação de Fernanda Montenegro. Procurou o Banestado que, sem maiores explicações, nem considerou o projeto. É verdade que na época havia o obscurantismo cultural da infeliz administração José Richa.
Mais recentemente, Denise fez uma premiada mensagem de fim-de-ano para o governo, criado por seu (ex)amigo Jamil Snege, da Beta, que ganhou premiações. Só que houve uma veiculação nacional, não pervista no contrato, para que Denise rodasse a baiana: contratou o escritório de advocacia de Eduardo Rocha Virmond para processar o Estado, o produtor do filme (Jaime Brustolin) e, de quebra, levando no rodão até o seu amigo Jamil Snege - que, naquela madrugada de inverno de 1968, quando após a primeira apresentação de "Círculo na Lua, Lama na Rua", foi o primeiro intelectual da cidade a lhe dizer palavras de estímulo e confiança - ela que se mostrava, no momento, tão insegura.
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Denise internacional, mímica famosa, aplausos de americanos e até a descoberta de que é dona de uma voz de contralto puro, que a faz ser uma futura musa de Fernando Bicudo, que anunciou que iria escrever uma ópera especialmente para ela. Ora, viva!
Aplausos para Denise que ela merece!
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