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Aramis

Criança, o melhor marketing visual

"Cinema, a melhor diversão para a família!" O que? Numa época em que as mais violentas imagens chegam as telas e o sexo explícito deixou de ser novidade, alguém pode ainda acreditar no cinema (assim como, de certa forma, na televisão) como lazer familiar? Pois é! Tanto sexo, violência, mortes, sangue, vísceras expostas, etc., que na concorrência das bilheterias transformaram o cinema, acaba, algumas vezes, perdendo para filmes ingênuos, simples, que enaltecem valores familiares e não precisam de qualquer apelação para conquistar um grande público. O exemplo maior é "Olhe quem Está Falando!" (Cine Plaza, 5 sessões, até quinta-feira) que custou apenas US$ 8 milhões (uma ninharia para os padrões orçamentários do cinema americano) e já rendeu mais de US$ 100 milhões, sucesso não só nos EUA, mas principalmente na Europa. "Variety" traz "Look Who's Talking" como campeão de bilheteria na Itália, França, Inglaterra, Grécia, Bélgica, Dinamarca, Noruega, Suécia, Holanda, Alemanha Ocidental e até na Hungria. Poucos acreditavam nesta produção modesta, dirigida por uma mulher - Amy Heckerling, ex-bolsista do American Film Institut e que a partir de 1982 realizou três comédias destinadas ao público jovem, sem maior repercussão: "Picardias Estudantis" (Fast Times at Ridgemont High); "John, o Gangster" (1984) e "Loucas Aventuras de uma Família Americana na Europa (1986). Na cabeça do elenco, um ator que após ter alcançado picos de popularidade, entre 1973/75 com "Embalos de Sábado a Noite" e "Grease, nos Tempos da Brilhantina", havia se tornado "veneno de bilheteria": John Travolta. Ao seu lado, uma atriz bonitinha, mas que também não é ainda conhecida: Kirstie Alley, do seriado "Cheers" (da TV americana) e a após ser figura decorativa para Tom Selleck em "Runaway - Fora de Controle" e Tom Berenger em "Atirando para Matar", finalmente conseguiu um papel melhor. Mas acontece que o filme tem uma fórmula que funciona: um bebê encantador. E a roteirista-diretora Amy bolou uma novidade: a partir do próprio bebê surgem as reações do filme - desde quando ele, ainda um espermatozóide, inicia seu caminho para a vida - o que pode lembrar, de leve, o melhor episódio de "Tudo o que Você Sempre Quis Saber sobre Sexo e Tinha Medo de Perguntar" (1972, Woody Allen), em que Allen é um espermatozóide lutando para chegar ao útero quando seu dono entra no campo da batalha sexual. A história é simples: Mollie, uma prosaica contadora, fica grávida (contra sua vontade) de um amante babaca, Albert (George Segal), que não se decide a largar a mulher hipocondríaca. Na hora do parto, em plena 5ª Avenida de Nova Iorque, um prestativo motorista de taxi, James (Travolta) acaba ajudando a ir ao hospital, assistindo ao parto e se tornando ama-seca de seu filho, enquanto ela procurava o "pai ideal" - já que o amante panaca é um mulherengo cafajeste. Obviamente, o bebê Mickey descobre o óbvio que sua mãe não entende: James é o melhor pai e antes do happy end muitas atrapalhadas acontecem. O encantamento para o público está na simpatia, beleza e humor do bebê - interpretado por quatro crianças diferentes, conforme o seu crescimento (Jason Schaller, Jayrd Waterhouse, Jacob Hames e Christoph Aydon). A voz adulta de Bruce Willis (da série "O Gato e o Rato", agora superastro de "Duro de Matar", cuja segunda parte está lotando os Cines Bristol / São João) como "Mickey", estabelece uma empatia com as platéias - especialmente a feminina, mas não deixando de cativar também até machões empedernidos. É impossível ficar imune a uma ternura tão bela de uma criança - e esta fórmula vem funcionando no chamado boom do "baby movie", deslanchado a partir do êxito internacional que há 4 anos a francesa Coline Serrault fez em seu "Trois Hommes et um Coffin" - de certa forma, inspirada num dos menos conhecidos westerns de John Ford (1895-1973), "O Céu Mandou Alguém" (The Three Godfathers, 1948), em que três cowboys (um deles, John Wayne, naturalmente) encontram uma criança no deserto e se enternecem. A comédia de Coline - com sua ação em Paris, onde três solteirões são obrigados a cuidar de uma criança (filho de um quarto colega de apartamento, em viagem), fez tanto sucesso que uma refilmagem nos EUA, dirigida por Leonard Nimoy (quando Coline desistiu de trabalhar nos EUA), conseguiu repetir o sucesso. A fórmula esteve deslanchada e um novo vilão era descoberto - surgindo outros filmes como "Arizona Nunca Mais" (Raising Arizona, 1987), "Presente de Grego" (1987), o delicioso "O Tiro que não Saiu pela Culatra" (Parenthood, 1988) e, por último, exibido na semana passada (Lido II, apenas 300 espectadores), um desejo de um casal ter um filho e contratando para tanto uma mãe-barriga de aluguel, no terno "Quase uma Família" (Immediate Family, 1989, de Jonathan Kaplan). Outros filmes poderiam ser lembrados nesta linha, gênero que, em absoluto, está esgotado. "Olhe quem Está Falando!" já tem uma continuação em pré-produção (com Mickey voltando aos 14 anos) e vai virar série de televisão ("Baby Talk").
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
24
28/08/1990

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