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Aramis

Como vencer na vida a qualquer preço.

Numa recente entrevista ("The New York Times Magazine", 15/1/1978), o ator Richard Dreyfuss, comentando a sua atuação no filme "O Grande Vigarista" (Cinema 1, hoje último dia em exibição) disse que apesar do prêmio que o filme obteve no Festival de Berlim, em 1974, provocou intensa reação junto a colônia israelita em Montreal. Um dos mais violentos artigos publicados num jornal idish, no Canadá, chegava a perguntar: "É Richard Dreyfuss realmente Duddy Kravitz?", referindo-se ao personagem que interpreta no filme. Mais do que a irritação judaica, em relação a um personagem ambicioso, amoral, em busca do sucesso a qualquer preço, a reação provocada e que lhe atingiu, valeu quase que como uma confirmação de sua extraordinária interpretação - quatro antes de receber o Oscar, de melhor ator, por seu trabalho em "A Garota do Adeus" (The Goodbye Girl, 1977, de Herbert Ross), baseado numa peça de Neil Simon. Realmente, filmes como "O Grande Vigarista" infeliz titulo que a Columbia Pictures deu, no Brasil, a "The Apprenticeship of Duddy Kravitz", inserem-se naquela categoria em que o personagem parece saltar da tela e vir de encontro ao espectador, tal a força, o entusiasmo com que é feita a interpretação. Duddy Kravitz, 19 anos, um jovem que desde a sua formatura, em 1948, pelo Instituto Fletcher Field de St. Urbain, Montreal, passa a perseguir o sucesso, a fortuna, tem a garra, o carisma, de outros personagens jovens - de uma linha que passa por criações que lembram obras de Sinclair Lewis a Elia Kazan. Mesmo longe das duvidas existenciais do bom caráter Studs Lonigan, do romance homônimo, (levado ao cinema em 1960, por Irving Lerner, num dos melhores filmes do cinema americano em todos os tempos), e com algumas semelhanças, ambientais, de "A Este do Éden" - os dois irmãos vivendo com o pai viuvo, a diferença de comportamento de cada um, no romance de John Steinbeck, filmado em 1954 por Elia Kazan ("Vidas Amargas", o grande lançamento de James Dean no cinema), o fato é que Duddy Kravitz é um personagem fascinante. Dentro de uma filmografia do judeu no cinema, sem dúvida esta produção relativamente modesta, rodada no Canadá há 4 anos pelo vigoroso Ted Kotcheff, adquire uma especial colocação. Sem panos quentes, mesmo correndo o risco de ser acusado de anti-semitismo, Kotcheff realizou uma segura transposição do romance de Mordecai Richler, que a propósito de acompanhar alguns anos de um jovem judeu pobre, na procura da afirmação econômica, traça um painel vigoroso da comunidade idish - seus valores, suas regras do jogo. A partir da diferente colocação de dois irmãos. Max (Jack Warden, extraordinária atuação), motorista de taxi, beberrão e tranqüilo, e Benjy (Joseph Weiseman), preocupado empresário do setor de confecções, sem herdeiros, os tipos da comunidade vão saltando aos olhos, impressionando por uma fácil identificação que se pode estabelecer entre eles e qualquer outra circunstancia geográfica mesmo em Curitiba. E neste aspecto reside a universidade de "The Apprenticeship of Duddy Kravitz", um filme que não teme em discutir valores e colocações em torno da ganância, da livre-concorrencia, tudo narrado com ritmo e precisão. Uma produção precisa, com uma bela fotografia de Brian West, a trilha sonora do inglês Stanley Myers e, sobretudo, um elenco de primeira linha - a começar por Richard Dreyfuss e Jack Warden, mas destacando também excelentes (e desconhecidos) coadjuvantes, como Micheline Lanctot (Yvette), Rand Quaid (Virgil) e Delholm Elliott (Friar), fazem de "O Grande Vigarista" um dos mais estimulantes filmes do ano. Um filme que chega modestamente, sem maiores informações - e que se não fosse pela premiação de Dreyfuss, talvez nem obtivesse lançamento regular - está, entretanto, naquela classe de obras corajosas e maiores, de visão obrigatória e que justifica uma polemica, mesmo - e principalmente - entre os aficionados do cinema não pertencente a comunidade idish.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
4
19/04/1978

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