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Aramis

Cinema ecológico e a participação de Fred

Curitiba, que há um semestre está sendo explorada mercadologicamente como a "Capital Ecológica do Brasil", vai assistir a uma mostra do cinema ecológico. A promoção - ao contrário do que seria natural - não tem o aval do município, mas sim, vai acontecer graças ao patrocínio de suas multinacionais - a Texaco e a Lufthansa - que viabilizaram o I Festival de Cinema Cidade de Curitiba (25 a 30 de setembro). Discreto e eficientemente, como é de seu estilo, o jornalista Wilmar Klein, 34 anos, ex-editor da "Quem" e coordenador deste evento, sabendo ouvir sugestões e procurando informações exatas, fez, sozinho, aquilo que as caras instituições oficiais de cultura do Estado não souberam aproveitar: trazer para que os curitibanos assistam uma mostra de documentários - e mesmo obras de ficção - de diferentes bitolas e procedências, que a executiva cultural Walkiria Barbosa, diretora da Fundação RioCine Festival, programou como o grande evento paralelo ao 5º Festival do Cinema do Rio de Janeiro. xxx Wilmar Klein, sem necessidade de dispendiosas viagens ao Rio, trabalhando de forma organizada, mostrou a Walkiria a importância que terá esta mostra do cinema ecológico podendo também ser vista em Curitiba. Assim, o festival que está organizando - e cujo patrocínio é dividido entre a Texaco e a Lufthansa - terá uma atração extra: filmes que tem, direta ou indiretamente como tema, o assunto mais discutido e comentado no momento: a ecologia. A programação ainda não está definida, pois mesmo Walkiria Barbosa, uma executiva com amplo trânsito nos meios cinematográficos, inclusive latino-americanos, vem há meses fazendo contatos para selecionar os trabalhos mais representativos. A mostra não se restringirá apenas a filmes (35 / 16mm), mas abrigando também vídeos e, como não haverá competição, a participação será mais ampla. Wilmar Klein e seus colegas do grupo executivo que organiza o Festival, ainda não se lembraram mas aqui fica a sugestão: a promoção da mostra do cinema ecológico poderia prestar uma merecida homenagem a um cineasta de raízes curitibanas, Frederico Fullgraf, que desde que retornou ao Brasil, há oito anos - após ter residido por quase 20 em Berlim Ocidental - vem se dedicando a documentários sobre temas ligados ao meio ambiente. Começou fazendo o belíssimo "Quarup - Adeus Sete Quedas", registro do fim das 7 Quedas, tendo como texto apenas a leitura (na voz de Lota Moncada) do poema de Carlos Drummond de Andrade. Posteriormente, denunciou a expulsão dos colonos das férteis áreas inundadas pelo lago de Itaipu - e as dificuldades encontradas por estas famílias na Amazônia, em "Expropriado". Com ajuda de Cícero Bley, na época presidente da Surehma - e que tem se mostrado um homem realmente preocupado com problemas ecológicos - realizou "DDA - Dose Diária Aceitável - O Veneno nosso de Cada Dia", denúncia tão vigorosa sobre o uso de agrotóxicos que provocou a ira de multinacionais do setor. Apesar das limitações de metragem, "Quarup", um curta de 12 minutos; "Expropriado" e "DDA", média-metragens e bitola (16mm), estes três filmes de Frederico Fullgraf foram exibidos em dezenas de países. Levados a festivais de cinema ecológico na França (onde "DDA" foi premiado) e na Índia, comprados pela televisão, mostrados em reuniões e congressos de ambientalistas na Europa e Estados Unidos, constituem trabalhos dos mais sérios produzidos entre nós. Apesar dos elogios e reconhecimento, especialmente no Exterior, nem por isto a vida profissional de Frederico se tornou mais fácil: há anos que vem lutando para realizar um média sobre a questão nuclear (área da qual é especialista e sobre a qual escreveu um livro, "A Bomba da Paz", Brasiliense, edição esgotada), um entre dezenas de projetos que aguardam recursos junto a Embrafilme. Frederico também tem pronto o roteiro - e engatilhada a pré-produção - de "Alemão Batata", longa-metragem, misto de ficção e documentário, sobre a verdadeira saga da imigração germânica no Sul do Brasil. Entretanto, como é uma pessoa íntegra, que não faz esquemas de autopromoções e nem freqüenta os acarpetados gabinetes da Secretaria de Cultura ou do Palácio Iguaçu, até hoje, Fullgraf não encontrou o menor apoio concreto no Paraná. Dentro de sua integridade pessoal vem tentando obter financiamentos no Exterior, especialmente na República Federal da Alemanha - país aliás que, através de instituições independentes, tornaram possível a realização de seus documentários. Filho de Willi Fullgraf, já falecido, durante quase 30 anos o gerente gráfico da Impressora Paranaense, tendo aqui vivido sua adolescência - época em que chegou a publicar em "O Estado do Paraná" os seus primeiros textos sobre cinema, Frederico retornou à Alemanha no final dos anos 60. Ali fez rádio, televisão e cinema, trabalhando também para a Internaciones (numa das visitas que o ex-governador Paulo Pimentel fez àquele país, como convidado oficial, foi Frederico quem o atendeu na qualidade de intérprete). Quando retornou ao Brasil, no início dos anos 80, pensou em se estabelecer em Curitiba com uma produtora - a Mutirão Cinematográfica - mas acabou desistindo. A antropofagia local, a concorrência desleal e, sobretudo, a falta de uma política cultural definida, capaz de estimular projetos realmente sérios, o fizeram procurar o Rio de Janeiro - onde também há uma selva violenta na área cultural, mas ao menos existem condições mais amplas de trabalhar. xxx Portanto, agora, quando se organiza uma mostra do cinema ecológico, Frederico Fullgraf não pode ser esquecido. Pessoalmente, não precisa (e talvez nem aceite) estas homenagens, mas que as merece, não há dúvida! Especialmente porque a amostragem não deverá se restringir a Curitiba: existe perspectiva do secretário Roberto Requião, da pasta do Desenvolvimento e Meio Ambiente, dar apoio para esta estadualização e ao menos um prefeito de visão, o jovem Ricardo Barros, 29 anos, já externou a simpatia de que Maringá - uma cidade das mais ecológicas do país - também veja esta mostra que em Curitiba acontecerá exclusivamente graças a Texaco / Lufthansa. O que até parece ironia, já que a nossa Prefeitura é a única do Brasil que concorre com a iniciativa privada mantendo nada menos que cinco salas de exibição, uma cinemateca e muita gente trabalhando na área. LEGENDA FOTO - Fullgraf: cinema ecológico.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
05/07/1989

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