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Aramis

Boris Karloff, a última sessão de terror

Todos os bons filmes já foram feitos (Peter Bogdanovich) O cinema motivado o cinema já foi realizado por muitos cineastas. O filme do (ou no) filme já se tem uma filmografia - desde denuncias do << estar system >> (<< A Grande Chantagem/The Big Knife, 1955, de Robert Aldrich) até um lírico e nostálgico trabalho como << A Noite Americana >>, realizado no ano passado por François Truffaut e que teve sua estréia nacional, há um mêsno Cine Flórida, dentro da Jornada Nacional de Cine Clubes. Mas possivelmente nunca houve um jovem que amasse mais o cinema e fizesse questão de dizer isto em todas suas obras do que Peter Bogdanovich, 31 anos, 5 filmes, a maior revelação nos últimos 4 anos, consagrado com << A Ultima Sessão de Cinema >> (The Last Picture Show, 1971), - um dos dez melhores filmes lançados em Curitiba no ano passado e que, se a Fama Filmes cumprir a promessa, será reprisado ainda este mês, no Excelsior. Mas foi em << Na Mira da Morte >> (Tergets, 1967), seu primeiro longa metragem - só agora em exibição na cidade (Cine Lido, 5 sessões diárias, até sexta-feira), que Bogdanovich faria uma catarse cinematográfica, realizando um thrilling em que colocaria para fora muito do que o entusiasmava e temia no cinema e realizando na verdade um quase documentário: Há 7 anos, então aos 26 anos, ao aceitar uma oferta do produtor-diretor Roger Corman, homenageou a um só tempo, dois gêneros eternos do cinema americano: o criminal e o horror, conduzido a história através da decisão de um veterano ator, Byron Orlok (Boris Karloff) em abandonar o cinema, só aceitando após uma noite de bebedeira, comparecer a uma << última estréia >>. Não num luxuoso cinema - o Chinese Theatre, da glamorosa Hollywood dos dos anos 40, mas um modesto Drive-In nos suburbios de Los Angeles, << uma cidade cada vez mais feia >> , como comenta Orloki à sua secretária Jenny (Nancy Hsueh) . Para quem << curte >> cinema , << Na Mira da Morte >> é um dos filmes mais ricos em elementos da indústria definida pelo russo Ilya Ehrenburg - (1891 - 1967) como a << Usina dos Sonhos >> : Nada do que Bogdanovich incluiu neste seu primeiro longa-metragem é gratuito: a homenagem aos gêneros terror-policial, a citação de um clássico de Haword Hawks, (<< The Criminal Code >> 1931), a presença do próprio cineasta (interpretando o diretor Sammy Michaels) angustiados perante a possibilidade << de não realizar o meu primeiro filme realmente importante >>, o início da ação numa cabina de projeção os créditos sobre as sequências do último filme de Byron Orlok) e o trágico final num drive-in . Para os ensaístas cinematográficos, como o jovem Lelio Sottomaior Jr. Hoje afastado da crítica, mas entre 1964-66, o mais ativo crítico da cidade, << Targets >> é um filme que oferece condições para interpretações das mais diversas, na relação realidade/fantasia, em que o cinema absorve a ficção ou a ficção é absorvida pelo cinema. Mas tudo isto, Bogdanovich fez num filme de extrema simplicidade - uma história movimentada e crítica, atualíssima quando de sua rodagem: em 6 de junho de 1966. Um jovem havia subido numa torre na Universidade do Texas e de lá assassinado seis desconhecidos. No ano de 1967, mais de 7 mil pessoas foram mortas por balas anônimas nos Estados Unidos - e no ano seguinte, dois líderes americanos - Robert Kennedy (1925-1968) e Martin Luther King (1929-1968), também morriam assassinados. Assim ao unir a melancólica decisão do ator Byron Orlok em deixar o cinema << pois ninguém mais pode temer monstros do passado, perante a realidade de hoje >> diz mostrando um jornal com a manchete que fala de sete pessoas assassinadas no supermercado - a súbita loucura do jovem Bobby Thompson (Tim O`Kelly), cabelos curtos, casados, integrando numa ajustada vida comunitária que, numa manhã, após uma noite insônia, assassinou a esposa Charlotte (Marry Jackson), a mãe Ilene (Tanya Morgan) sai pela cidade, << matando muitos antes de morrer >>, Bogdanovich soube, com rara felicidade, dar um sentido profundamente sociológico a sua visão de um momento na realidade americana. E como já disse outro jovem cineasta (Jean Luc Godard) - << o Cinema é a vida 24 vezes por segundo >>. Mas talvez seja no personagem Byron Orlok que esteja o sentido mais nostálgico de << Targets >>: Boris Karloff, (Dulwich, 1887 - Mihurst, 1969) ator inglês, na verdade Charles Edward Pratt, e, cada um dos diálogos que pronuncia, parece estar fazendo uma dolorida autocrítica, de sua longa carreira de ator-monstro do cinema americano. Nascido na Inglaterra, aluno do Uppingham King College, em 1909 emigrou para o Canadá onde iniciou sua carreira teatral, que o levou em tourné aos EUA. Em 1916apareceu pela primeira vez num filme, mas só 15 anos depois é que se tornaria um nome famoso, ao viver a famosa > de << Frankstein >>, que James Whale (1897 - 1956) realizou com base na fantástica novela de Mary Shelly (1797-1851), esposa do poeta romântico Percy Shelley (1792 - 1882). Tornando-se um clássico do cinema de terror - ao ponto de merecer até hoje sucessivos relançamentos (existe uma cópia no Brasil, que João Arachesk, da Fama Filmes, promete exibir no Sca la) - a interpretação de Boris Karloff em << Frankstein >> marcaria toda sua carreira: no ano seguinte faria << A Múmia` (The Munny, 1932) de Karl Freund, 84 anos, hoje aposentado. Mas, e é curioso saliente isto, em 1931, em que Karlof interpretou nada menos que 14 filmes, iniciou o ano atuando em << The Criminal Code >> de Howard Hawks - então com 35 anos - e só a 16 de novembro, faria << Frankstein >>. Dois anos depois Karlof voltaria a atuar em outro filme de Hawks - este de uma grande dimensão mundial, << Scarface , a Vergonha de Uma Nação" (Racktters), produzido pela United Artits, com base no romance de Willian R. Burnett (também existe cópia no Brasil, que igualmente em breve deverá ser projetado na nova fase de programação do Cine Scala). Ao morrer, aos 82 anos, Karloff deixou uma filmografia de 130 títulos, levantados pelo seu biografo Denis Gifford (<< Karloff, The Man, The Monster, The Movies, Curtis Book, New York, 1973). Assim, de sua primeira aparição de realce na tela - embora o crítico espanhou Roman Ruben Garriga - Nogues, na página 211 do 2º volume da "Enciclopédia Ilustrada Del Cine"(Madri 1970), cita o ano de 1916 como o da primeira atuação de Karlof no cinema - Gifford marca sua estréia numa ponta de << Sua Majestade o Americano >> (His Masjesty The American), concluído por Joseph Henabory em 1º de setembro de 1919 - com Douglas Fairbanks (1833 - 1939) como astro - ao seu ultimo filme, << House of Evil >>, rodado em 1968, por Enrique Vergara - Jack Hill, no Interior do México, a carreira deste ator foi sempre marcada por papéis caricados, numa época em que os << monstros >> cinematográficos poderiam assustar uma América menos violenta. Bogdanovich, com extrema sensibilidade - aliás qualidade que ele mostraria em toda extensão em seu nostálgico filme seguinte (<< A Ultima Sessão de Cinema >>), fez uma justa homenagem a Karlof que nunca, em sua longa carreira esteve melhor em nenhum de seus filmes ou nas múltiplas atuações no teatro - campo em que também chegou a ser um nome de destaque. Assim, para uma faixa de publico que apenas ve em << Na Mira da Morte >> um bom policial ou uma inteligente crítica a violência americana (a venda indiscriminada de armas) é preciso refrescar a memória, recorrer a uma breve pesquisa para dar a real dimensão de homenagem que Bogdanovich presta aquilo que mais ama: o cinema e os homens que o fizeram a grande arte deste século, embora ele próprio lamente: << faço filmes como os que eu gostaria de assistir, pois todos os bons filmes já foram feitos >>. Com atraso de sete anos os curitibanos assistem esta semana o primeiro longa-metragem de Peter Bogdanovich, para muitos considerado o novo Orson Welles do cinema americano. "Na mira da Morte" é uma fusão de dois gêneros americanos por excelência - o terror e o policial, mas acrescido de uma linguagem documentaria sobre o cinema como industria e ao mesmo tempo uma nostálgica homenagem a um dos mais famosos atores características de Hollywood, Boris Karlof (1887 - 1969). As vésperas do relançamento de "A Ultima Sessão do Cinema"- filme que consagrou Bogdanovich e também prestes a estréia de sua fita mais recente, "Lua de Papel a exibição de "Targets" adquire especial significado nesta semana de bons filmes em exibição nas telas da cidade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
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1
05/03/1974

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