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Aramis

A boa estréia de Belini e outros jovens de talento

Pequena mas agressiva em termos de competição no mercado fonográfico brasileiro, a RGE/FERMATA, de São Paulo, fundada em fins dos anos 50 por José Scatena e que teve uma fase dourada, quando Benil Santos foi um dos seus mais ativos produtores, está tentando se manter no mercado brasileiro, enfrentando o poderio das fábricas que dispõe de apoio no exterior. Para tanto, em termos de catálogo nacional, está investindo em novos interpretes e compositores, pois foi assim que em 1968 conseguiu contratar um moço chamado Toquinho que só há poucas semanas pode passar para outra gravadora (Phonogram). Este ano, após ter lançado um excelente jovem compositor-[intérprete] chamado Naire, num belíssimo lp produzido por Paulinho Tapajós (que também ali grava o seu primeiro disco como cantor), a RGE colocou nas lojas o lp " Vazante (303.0024, maio/74), com uma extraordinária revelação: Belini Tavares. Neste primeiro semestre, sem dúvida foi este o disco-revelação dentro de uma faixa romântica de samba-canção. No inteligente texto de contra-capa, Belini Tavares confessa que "quando surgiu a idéia de fazer uma canção, pareceu-me absurda pretensão, Apesar disso e do resultado, a experiência me atraiu. Notei que era imensamente bom exteriorizar sentimentos e idéias por meio de música e palavras. Restava saber se eu poderia fazê-lo e alcançar resultados diferentes do primeiro... De qualquer forma, fui insistindo e os resultados iam sendo guardados sigilosamente. Afinal, más ou boas, havia algo de mim naquelas canções. Deixar que se tornassem objetos de riso de alguém seria expor meu próprio "eu", idéia que, convenhamos, não é das mais agradáveis. E jamais pensei em mostrá-las a alguém até que, por volta de 1968, formamos, na faculdade, um conjunto vocal batizado de Musicachaça, que iria influir bastante neste comportamento". "A Musicachaça" durou pouco mas foram muitas as suas heranças. E Belini Tavares permaneceria limitando aos seus amigos se ele não tivesse encontrado aquilo que chama de "minha personagem", que, a cada passo, lhe deu a mão, corrigindo, "apontando a direção da luz que eu não enxergava". E por ter sobretudo o "fazer ver" "que eu apenas não queria admitir uma tentativa mal sucedida" e que suas canções eram "anteriores ao sonho não atingido, haviam vindo antes dele e por motivos bem outros sem nenhuma ligação com ele", resultou "um disco de muito amor". A voz de Belini é forte, marcante, suave - lembrando uma mistura de Carlos Lyra e Sérgio Ricard, no início dos anos 60, somado ao Dick Farney de sua fase mais romântica. Mas isto não implica em dizer que ele não tenha personalidade artística. Ao contrário, "Vazante" é um disco marcante pela beleza de cada faixa - das músicas mais românticas como "Descoberta", "Canção de Certeza" e "Amor-Razão" que dedica a sua musa, Suely Breda, a um [melancólico] "Chorinho" até um a "Modinha (Seresta nº 5). Todas as 13 músicas deste lp - com arranjos de Élcio Alvares e Messias Santos Júnior - revelam um compositor de enorme grandeza que sem preocupações de "inventividade" cante os sentimentos, fala de pessoas, faz poesia como poucos poetas fariam, tem melodia e musicalidade. Enfim, BELINI TAVARES é uma grata revelação que não temos dúvidas em saudar com todo o entusiasmo. Até agora pouco se falou deste lp e é possível que ele não chegue a vender o suficiente sequer para incentivar a gravadora a chamar Tavares para um novo lp. Mas uma coisa eu tenho certeza: para pessoas de sensibilidade, em especial as que sentem a música como um complemento de poesia/coração/criação, "Vazante" ganha um lugar na primeira fila. E, quando retirado de catálogo, muitos que agora não aproveitam a oportunidade de adquiri-lo, vão buscar os raros exemplares para fazer cópias em fitas. Como hoje se faz com "Não Gosto de Mim" - lp que um moço chamado Sergio Ricardo gravou em 1960 e que como agora acontece com Belini Tavares, passou despercebido. Para depois se tornar um clássico. Por isto, aqui fica a dica: "Vazante" é um disco-revelação com "Por que Você Não Quis" (Silvio Pereira/Jorge Barbosa), " Não Sabemos Pedir Perdão" (Paulo Debétio/Mercier). Mesmo compositores mais comerciais - como Roberto Corrêa/Jon Lemos ("Intrigas e Opiniões") são valorizados em sua interpretação segura. Luiz Ayrão, um nome promissor na MPB. No mínimo ... xxx Sem pretensões de gravar apenas suas composições, Luiz Américo em seu "Fim de Prosa" apresenta um repertório leve e descontraído, [às] vezes crítico (como "Pena Que Ela Seja em Cores" de Dora Lopes/Clayton) outras chegando até a emoção ("O Bom É O Juca", de Carlos Magno, lançado há 4 anos num lp de Marcus Pereira, em tiragem limitada). Com um excelente grupo instrumental para [acompanhá]-lo - onde se destacam os bateristas Wilson das Neves e Walter Arruda, Poly e Neco no cavaquinho, Dario Lopes e Messias Santos Jr, nos violões, Luiz Américo fez um bonito lp, agradável e bem produzido, com caprichados arranjo do maestro Elcio Alvarez. Outras faixas: Tanto Amor Jogado Fora" (Mathusalem/Dora Lopes), "Luz Vermelha"(Alberto Luiz/Zé da Padiola), "Quem Há de Dizer" (Lupicinio Rodrigues/Alcides Gonçalves), "Decepção" (Sérgio Roberto), "Rimas Prá Tristeza"(Clayton/Marcelo Duran) e "Na Casa da Ria Ciata" (Artulio Reis/Monalisa). Suas composições: "Fim de Prosa", "Bar em Bar" e "Diferença", as 3 em parceria com Braguinha e mais "Samba Sem Bandeira". Lançado em setembro do ano passado, só agora nos chega às mãos o lp de [estréia] do antor-compositor Guilherme Lamounier, jovem parceiro de Tibério Gaspar, com um estilo suave e que teve a valorizar suas interpretações os arranjos e [regência] de Luis Claudio. Com sinceridade e suavidade, Guilherme mostra neste seu lp (Continental, 100.002) um punhado de [músicas] expressivas, mas das quais nenhuma conseguiu se destacar em termos de sucesso popular. Faixas: "Mini Neila", "GB em Alto Relevo", Patricia", "Os Telhados do Mundo", "Feedom", Capitão de Papel, "Amanhã não sei", "Será Que Eu Pus Um Grilo Na Sua Cabeça?", "Passam Anos, Passam Anas" e Cabeça Feita. xxx Filho de um dos gigantes da [música] popular, Ataulfo Alves Junior, poucos meses após a morte de seu ilustre pai (1909-1969), gravou na Phonogram um lp intitulado "O Herdeiro Sou Seu", mas que não obteve nenhuma repercussão. Passados mais 4 anos, mais amadurecidos, o filho do grande Sambista faz nova tentativa desta vez sob a segura orientação de Sérgio Cabral (Ataufo Alves Junior, Victor, 103.098) junho/74, que garante na contracapa que a responsabilidade do Junior muito grande, pois embora ele não goste, por exemplo, que o fato de ser filho de uma das maiores figuras históricas da música popular brasileira seja utilizado para a sua promoção, mas está plenamente consciente de que tem que dignificar o nome do velho Ataufo Alves. Responsabilidade esta que foi o maior [estímulo] para este disco, onde homenageia seu pai com a gravação de quatro de suas melhores composições: "O Requebrado da Mulata", "Meus Tempos de Criança", "Ilusão de Carnaval" e "Infelicidade". De seu mano, Adelino Alves (1936-1968), ele gravou "Ilusão de Carnaval" e "Casa 33", ambas em parceria com Vargas Junior, além de uma [própria] parceria com o irmão, "Felicidade em Mangueira". As letras de Adelino tinham o sabor poético e bem carioca, exclusivo dos grandes autores tipo Wilson Batista, Geraldo Pereira e o próprio Ataufo, como disse Cabral. Com uma sincera [espontaneidade] o Junior interpreta ainda "Fim de Carnaval" (Leci Brandão), "Isso Tem Que Acabar" (Noca /Mauro Duarte), "A procura da Felicidade" (Mauricio Tapajós/Mauro Duarte/Paulo Cesar Pinheiro), "Canto de Amor" (Delcio Carvalho/Barbosa Lima), "Verso de Canção" (Delcio Carvalho/Barbosa Lima) e uma bonita homenagem de Rildo Hora/Adão Pereira Nunes a dois grandes nomes de nossa MPB: Agostinho e Vinicius. xxx Rico (é um dos 3 cantores brasileiros de maior sucesso financeiro do Brasil), Jair Rodrigues, a exemplo de Jorge Ben, também ganhou da Philips um lp em homenagem aos seus 10 anos de sucesso naquela [fábrica]. Lançado com grande esquema promocional mas recebido com frieza pela crítica, Jair Rodrigues 10 anos depois (Philips, 6349105, junho/74) apesar dos cuidados de produção e da convocação de [três] maestros, além de Cesar Camargo Mariano na faixa "Depois do Carnaval" (Beto Scala/São Bento), não consegue mesmo um destaque maior. É um lp sorridente, como o próprio [intérprete] - tema [aliás] muito bem analisado por J. Ramos Tinhorão. Para quem não possui os discos anteriores do comunicativo [crioulo], é uma oportunidade de ouvi-lo panoramicamente, desde suas interpretações mais vigorosas ("Disparada", Geraldo Vandré/Theo) até as mais comerciais (O Conde, Evaldo Gouveia/Jair Amorin), passando por [êxitos] carnavalescos (Tristeza, Miltinho/Haroldo Lobo; Bloco Solidão, Evaldo Gouveia/Jair Amorin) ou bons clássicos, como Castigo (Dolores Duran) e Cadeira Vazia (Lupiscinio Rodrigues), Molambo (Jayme Florence /Augusto Mesquita) e Dó-Ré-Mi (Fernando Cesar) até um tango - "Por Uma Cabeza" (Carlos Gardel/Alfredo Le Pera), talvez para recordar seus magros tempos de crooner de boites da Boca do Lixo em São Paulo. xxx Martinho da Vila, outro sambista de muita comunicabilidade, está na praça com um novo lp, ao lado dos Originais do Samba, enquanto seus dois lps editados em 1972/73, também continuam no catálogo da RCA- Victor: Batuque na Cozinha e Origens. São, no total, 3 lps de muito samba, com o expressivo compositor [intérprete], prestando merecidas homenagens a nomes [básicos] de nosso Samba como João da Baiana (1887-1974) em Batuque na Cozinha e Donga (Pelo Telefone, de Ernesto dos Santos). Ao lado destas homenagens, Martinho mostra seus [próprios] sambas. (Xô, Chuva Miúda, Na Outra Encarnação, Marejou, A Saudade e Samba, Não Chora Meu Amor, Antonio, João & Pedro, A Caveira, etc.) ao lado de bonitas criações de outros sambistas atuais, como João Nogueira (Beto Navalha), Antonio Grande (Quem Lhe Disse Que eu Chorei?), além de trabalhos coletivos ou mesmo temas folclóricos. Em Origens, destaque-se ainda um belo tributo a Monsuelo de Menezes (1926-1973). Recados a parte, Martinho da Vila também merece destaque no panorama do MPB. Pela legitimidade de seus trabalhos, ao qual veio acrescentar, este ano, a produção de um dos melhores lps da coleção "[Música] Popular do Centro["] para Marcus Pereira.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Música Popular
53
21/07/1974

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