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Aramis

Artigo em 13.10.1981

CLAUDIO DENIS é o mais novo cantor-compositor a surgir na praça com um disco independente: "Linda Manhã", que registrou em sua etiqueta Vôo Livre. Poucos discos independentes apareceram com tanto esmero e cuidados de produção: registrado entre janeiro a agosto de 1981 nos estúdios da J. V. Criação, Produção e Gravação, com a participação de instrumentistas jovens mas competentes, incluindo harpa, trompas e secções de violinos, este é um disco-apresentação. Sente-se ao longo das 12 músicas um jovem compositor de talento, sensível, capaz de uma época de crise e indagações existenciais, assumir o amor ("Aonde o teu olhar se esconde", "Doce Beleza", "Lábios teus"), a importância de se ver a cada novo amanhecer com esperança ("Linda Manhã"). É claro que não poderia faltar um pouco de dúvidas com relação aos caminhos, o que se sente, especialmente em "Marionete" ("Papai me ofereceu um grande palco: no seu compasso/coração de aço / Mamão recomendou não ser vaiado: Marionete consciente; vou despir a fantasia / entender melhor / meu papel neste folia"). Um pouco do mundo da infância está em "Criança Crescida" ("Sou criança sou crescido/ Sou velho sou menino// E perdi aquela agenda / O relógio e compromisso"), "Fada" e "Menina Azul". Um toque de ficção científica, bem humorado em "Disco Voador" e um vôo maior no campo da poesia em "Gotas", onde não falta também a mensagem do amor. Estudando música há 7 nos, inicialmente no CLAM, do Zimbo Trio, depois canto com a professora Regina de Boer; harmonia com o maestro Cláudio Ferreira; música eletrônica com Luis Roberto Oliveira, Claudio Deniz em 1976, quando estudava jornalismo, musicou "As 3 Faces do Poder". No ano passado, dedicou-se ainda mais ao estudo e harmonia com Claudio Ferreira (melhor arranjador do festival MPB-81, por 'Londrina", de Arrigo Bernabé), Claudio entregou os arranjos e regências de todas as faixas deste seu "Linda Manhã" a Vicente de Paula Salvia (Viché), ex-pianista do histórico João Sebastião Bar (1961/63), Gabriel Bahles, no baixo; tenor Gandra na guitarra; Dudu Pontes na bateria; Roberto Sion no sax; Norma Rodrigues na harpa e Rubens de Souza Soares, na percussão - foram alguns dos músicos que ajudaram a fazer este disco sensível e promissor de um grande talento. xxx Ressurgindo no cenário fonográfico após um longo período de inanição, a RGE surpreende com três vigorosos talentos jovens, todos na poeira dos últimos festivais de MPB: Jessé, Accioly Neto e Leci Estrada. Num ano dos mais fracos em termos musicais, a presença destes três intérpretes é bastante significativa, já que Accioly e Leci são também compositores de linhas definidas - embora ainda em início de carreira. JESSÉ, melhor intérprete do festival MPB-80, chega para preencher um espaço (quase) vago em nosso cenário musical. Afinal, com exceção de Emílio Santiago - e que também está começando a cansar, praticamente não temos novos e bons cantores. Com boa mudalação de voz, balanço certo, Jessé traz a tonalidade certa às canções que interpreta, buscando um corajoso repertório de autores praticamente inéditos - como Graco ("Pelos Cantos"), Aroldo Santarosa/Silvia Villego ("Chão Descalço"), Mário Marcos/Mário Maranhão ("Sujeito a Chuva e Trovoada"), Zeca Bahia/ Fernando Coelho Teixeira ("Estrela Reticente"). É claro que há também compositores já testados, como Oswaldo Montenegro ("Era um dia ..."), Belchior ("Voz da América"), Guilherme Arantes ("Cá Entre Nós"), sem citar uma emocionante regravação daquela que foi a melhor música brasileira de 1980: "Eu te amo" (Tom/Chico Buarque). ACCIOLY NETO, que se destacou na [MPB-81], com "No Nosso é Refresco", confirma ao longe de 10 outras músicas no "Diabólica Trindade" que é um demolidor e satírico compositor, com uma linguagem descontraída e irônica. Accioly não busca o humor da baixada fluminense, como faz o Dicró, mas observa, de uma maneira pessoal, temas do momento recriando em canções como "Desespero de Causa", "Paraíso de Hienas", "Diabólica Trindade", "Natureza Sonhadora", "Relatório", "Revestrez" e "Só Por Teimosia", assuntos dos mais interessantes. A única composição de outro autor, no caso autora - "No quem me quer" de Irene Accioli, também não deixa de ter a (deliciosa) marca da irreverência: "Eu embrulhei meu coração "pra presente"/ E, na ilusão, eu perfumei as axilas, eu penteei as sobrancelhas... / E passei a escola no meu dente, fui em frente...". Mesmo nos momentos mais românticos - "Estorinha da Cacilda", Accioly não deixa de ser crítico e social ao mesmo tempo: "Eu era só uma perdida / Carne nova, recém-chegada à cidade / E esse homem, tão bonito / Quis tomar conta de mim / Me bate, mas me protege / Me explora, mas ama / E eu sou tão feliz". LECI ESTRADA procura em seu lp de estréia os caminhos verde-amarelos do canto rural. Buscando, por exemplo, um acordeonista de raízes como Oswaldinho, oferece momentos do melhor canto rural como em "Violando", letra de Sérgio Sá, também seu parceiro em "Deixa Estar", "Bom Seria", "Canto de Louvor" e "Voar com Gaiola e Tudo". Em outras faixas, Leci inverte a posição: "Voltar" tem sua letra e música de Aloísio e "Mãe Alegria" o revela também como letrista e compositor. De Daltony Nobrega é outra das melhores faixas do disco: "Colonos". Também numa linguagem rural, Leci canta "Numa velha casa / Moram dois senhores / Cada qual é o dono / Da sua fatia / E ao redor da casa / Casa de colonos / Que se crêem donos / Do que cultivam". Bons arranjos e a presença de instrumentistas seguros, faz com que se escute com relativa atenção esta estréia em lp de Leci Estrada - sem dúvida - e não pretendendo fazer aqui trocadilhos, com boas condições de andar bem nos caminhos da MBP neste final de ano. Dois anos depois de haver descoberto que não era apenas um músico de competência reconhecida no mercado, mas também um compositor de primeiro time, o guitarrista FREDERA (Frederico Mendonça de Oliveira), lança seu primeiro disco, "Aurora Vermelha" (Som da Gente, novembro/81). O disco é como Fredera acha, um resumo completo de quanto ele sempre foi na vida. Por exemplo, o guitarrista, que, no momento, trabalho com Gonzaguinha, já transitou por muitas áreas musicais e não se considera preso a qualquer influência. Da música erudita ao rock, passando pela ópera e pelo samba, ele ouve e toca de tudo, não tem qualquer tendência a copiarem gênero a que Fredera se dedicou, à exaustão e domesticamente, durante dez dias, em 1979. A faixa que dá título ao LP é uma suíte m 3 partes e nela Fredera pretende transmitir um estado de sentimento bem brasileiro. "Música Viajante", uma peça para violoncelo e violão, demonstra o virtuosismo de Fredera neste instrumento. "O Horizonte nos olhos de Manu" é um teme especialmente composto para seu filho único, de 7 anos. Sua mulher, Isaura Clara, também é homenageada no disco com o boleto "Clara Cheia de Luz". Em memória de seu amigo e colega Tenório Jr. desaparecido tragicamente na noite argentina. Frederico Mendonça de Oliveira (carioca, 26 anos) compôs "Um Bolerésio". Com a participação de excelentes músicos - Jota Moraes (teclados), Paulo Maranhão (baixo), Pascoal Meireles (bateria e percussão) e mais as presenças especiais de Amilson Godoy (piano acústico, em "Pequeno Poema Libertário"), Théo da Cuíca (percussão no geral e solo de cuíca em "Pequeno Poema ..."), Walter Santos (cabacinha em "Clara cheia de luz") e Gonzaguinha (voz, com Fredera, em "Clara cheia de luz"). Um dos melhores discos do ano, dentro do capricho que tem marcado todas as produções de Walter Santos/Tereza Souza, "Aurora Vermelha" é enriquecido ainda por um manifesto de Fredera, fazendo importantes colocações sobre a MPB e o papel dos músicos-compositores que ocupa todo o encarte. Um belo disco. O grupo RUFUS, destacando a vocalista CHAKA KHAN tem mais um disco lançado na praça: "Camouflage" (Ariola/MCA). Formado há alguns anos e tendo sofrido várias modificações, o Rufus funde estilos diversos (thttum & blues, jazz, rock e funck) e agrada a uma faixa de público. Se assim não fosse, não teria conquistado 6 discos de ouro e um de platina. Chaka Khan e o contém músicas que contam com a colaboração de cada membro do grupo. Quatro delas escritas por Tony Maiden e David Wolinski, Bobby Watson em duas outras, assim como em Chaka Khan e ainda Kevin Murphy e John Robinson. Destaque para as faixas "Sharing the Love", balada de Murphy e embalada pelos vocais de Chaka Khan e "Better Together", "Music Man" e "Jigsaw", estas ao gênero funk. OS ORIGINAIS DO SAMBA, conjunto vocal e de percussão, criado no Rio, no início dos anos 60, com a participação de [Muçum] (Antônio Carlos Bernardes, 1941), Rubão (Rubens Fernandes, 1933-1977), Bigode (Arlindo Vaz de Lima, 1946), Bibi (Murilo da Penha Aparecida e Silva), Chiquinho (Francisco de Souza Serra, 43) e Lei (Wanderley Duarte, 1946), apesar de várias mudanças continua a resistir. Muçum, é bem verdade, é hoje um dos astros da série "Os Trapalhões" e o grupo está formado por Bigode, Lelei, Chiquinho e 3 novos elementos: Zinho, Coimbra e Claudio. Em comparação ao tempo em que o grupo se limitava a acompanhar Jair Rodrigues e fazer discos com sambão-jóia, pode-se dizer que houve uma sensível melhoria. Para isto basta ouvir o novo lp dos Originais, que abre com uma sentida homenagem a Zé Keti presta a "Clementina de Jesus", em faixa com a participação de Geraldo Filme. De Gilberto Gil, os Originais gravaram "Ela" e de dona Yvone Lara é "Alguém Me Avisou". De Caetano, o "Gema". Claro que não faltam sambões tradicionais, como "Telhado de Vidro", "Pirão e Colher de Pau" e o belo "Ausência", de Délcio Carvalho - Noca- Barbosa da Silva, também uma das melhores faixas do LP. Quem gosta de samba e é exigente, pode ouvir este disco dos Originais. Está bem melhor do que o que faziam antigamente. Lançamento da RCA.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Jornal da Música
27
13/10/1981

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