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Aramis

A alegria e malícia da sapeca Rita Lee

Rita Lee é alegria. Poucos artistas conseguem transmitir em suas músicas tanta alegria, revestida de um deboche e mesmo sensualidade, como esta paulista filha de ingleses. Curiosamente, tal como Gretchen - só que esta sem o talento de Rita - ela consegue também, em sua forma informal, bem humorada, satírica e mesmo picaresca, identificar-se a um público infanto-juvenil. Já estávamos com saudades de Rita Lee. Ausente das gravações há quase três anos, Rita fazia falta. Felizmente, contratada pela Odeon, voltou com grande carga promocional - a partir do momento em que iniciou a gravação deste "Flerte Fatal" nas lojas, há mais de dois meses. Rita Lee, às vésperas dos 40 anos - a serem completados no final do ano (31 de dezembro), mantém a jovialidade e o espírito serelepe que a caracteriza desde os 18 anos, quando, sem tocar nenhum instrumento, formou um conjunto com mais quatro garotas, as Teen Age Singers, que participavam de shows e festas colegiais em São Paulo. Descobertas pelo cantor (hoje produtor gráfico) Tony Campelo, passaram a fazer coro para as gravações dos roqueiros da época: Jet Blacks, Demetrius (hoje um tranqüilo vendedor pracista), Prini Lorez (inventado em cima do sucesso de Trine Lopez, com seu sucesso de "La Bamba"). Conhecendo Arnaldo Dias e seu irmão Sérgio, Rita viria a formar "Os Mutantes", grupo que há 21 anos estreava no programa de TV "O Pequeno Mundo de Ronnie Von". E Os Mutantes viriam a marcar uma época da MPB, com estrepolias, inovações e talentos. Em 1969, Rita fazia seu primeiro elepê individual ("Build-Up"), com o mesmo título do show da Rhodia. Iniciava assim uma carreira solo, que 18 anos depois, continua vigorosa e forte. Na verdade, Rita sempre gostou de trabalhar em equipe. Os Mutantes foram marcantes em sua vida, assim como a união com o guitarrista (e marido) Roberto de Carvalho marcaria sua carreira nos últimos anos. A crítica recebeu com algumas pedradas este novo disco de Rita, acusando-a de repetir o mesmo esquema que marcou seus álbuns de maior sucesso, feitos na Sigla/Som Livre. Realmente, pode até proceder esta colocação, mas isto não invalida o clima descontraído e alegre que Rita passa neste elepê, na qual, mais uma vez, ironiza temas do cotidiano - como "Brazix Muamba", que teve problemas com a Censura por versos como estes: Viva Brazix / Morrendo de dor AIDS quem faz amor / Angra I, Angra II, III e depois Anjo exterminador. Rita Lee é a antifeminista, mulher apaixonada e submissa em "Bwana" ("Me chama que eu vou / Sou tua mulher robô / Teleguiada pela paixonite / Que não tem cura / Que não tem culpa pela volúpia"), a colegial sapeca de "Pega Rapaz" ("Alô doçura / Me puxa pela cintura / Tem tudo a ver o meu pingüim / Com a sua geladeira"), fala de gatos e cachorros em "Xuxuzinho" e assim como ironizou os músicos e compositores em "Estourou a Festa", volta ao tema para brincar em "Músico Problema" ("Ele é músico-problema / Sola na pausa, rouba a cena / Só ele aparece / Só ele acontece e leva o lucro / É viralata / Persona non grata, vive maluco"). A música que dá título ao disco também tem aquela empatia jovem e simpática, tão ao gosto de um "Pecadinho / Escondidinho / Rapidinho / Gostosinho no banheiro social". O repertório não ficou apenas na parceria Rita-Roberto: com Lee Marcucci e Luís Carlini é "Me Recuso"; com o dramaturgo Antônio Bivar, Carvalho compôs "Picola Marina" - o momento mais romântico do disco, com Rita mostrando seu vigor de intérprete; e com André Christovan foi a parceria de "Para com Isso", que cita até a Telesp em sua letra. Como encerramento, um clássico da música americana, "Blue Moon", de Richard Rodgers (1962-1979) e Lorenz Hart (1895-1943), ganhou uma cuidadosa versão de Rita, trazendo para o português a beleza deste hit que há mais de 5 décadas embala romances em todas as latitudes.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
7
05/07/1987

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