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Aramis

Alaide, cantora de verdade

Se existe uma definição perfeita para Alaide Costa é a de cantora de câmara. Uma voz fina, afinadíssima, perfeita, única e original - que a faria ser uma artista consagrada, valorizada profissionalmente e sem ter que se preocupar com qualquer problema material se tivesse nascido na Europa ou nos Estados Unidos - e não no Rio de Janeiro (08/12/1935). Com 40 anos de carreira - começou a cantar em programas infantis do rádio e com 12 anos vencia o concurso promovido por Paulo Gracindo no seu programa "Seqüência G3", da Tupi-RJ e já no seguinte era destaque em "Arraia Miúda", apresentado por Renato Murce, na Rádio Nacional - Alaide Costa sempre foi uma cantora rara e especial. Ternura é uma adjetivação que também se pode aplicar a esta cantora que, há 31 anos, fazia sua primeira gravação (o 78 rpm "Tarde Demais", Odeon) e que lhe valeu o prêmio de Revelação do Ano (no mesmo ano lançaria "Conselhos", de Hamilton Costa/Richard Frano e "Domingo de Amor", de Fernando Cesar). Portanto, uma longa presença na MPB - com uma participação muito especial na Bossa Nova (João Gilberto, entusiasmado por sua voz, procurou atraí-la para o movimento e, em 1959, ajudou na escolha do repertório para o seu primeiro lp, "Alaide Canta Suavemente", RCA, com músicas de Tom, Vinícius, Carlos Lira e "Minhas Saudades", de João Donato e João Gilberto). Ao longo dos anos 60, Alaide fez outros elepês e criou um clássico da BN - "Onde está Você" (Oscar Castro Neves/Luverci Fiorini, 1964). O maestro Diogo Pacheco, sempre atento, sentiu suas possibilidades para um espetáculo unindo o clássico ao popular ("Alaide, Alaúde", Municipal de São Paulo, 1965). Cantora perfeita, extremo bom gosto em seu repertório, seria natural que Alaide tivesse um espaço especial. Entretanto, ela - como tantas outras grandes vozes (Márcia, Claudete Soares, Doris Monteiro e mesmo a Divina Elisete Cardoso, para ficar em poucos exemplos), tem sido vítima do cruel e desumano processo de esquecimento de nossos maiores talentos. Raramente Alaide é lembrada para programas de televisão, os shows têm que ser cavados com dificuldade e para gravar, só em produções independentes. Em 1982, um de seus maiores fãs, Hermínio Bello de Carvalho, co-produziu um belíssimo disco ("Águas Vivas"), com Alaide interpretando de forma definitiva as belas composições de HBC. Superando problemas físicos (inclusive uma ameaça de surdez), conservando toda sua ternura e perfeição como intérprete, Alaide merece ser ouvida - e Paquito Modesto, na administração do Paiol, está quebrando lanças para trazê-la a Curitiba em outubro (ocasião em que o Clube Curitibano - ou o Country - também poderiam contratá-la para um espetáculo marcando os 30 anos da Bossa Nova). Com apoio da Coca-Cola, Alaide Costa fez um belíssimo elepê independente -candidato forte a estar entre os 10 melhores do ano e que não sendo encontrados nas lojas pode ser solicitado diretamente à cantora (rua Acalanto de Bartira, 16 - Jardim Bonfigliole, CEP 05358, SP). "Amiga de Verdade", título do álbum, é uma prova de quanto Alaide é estimada: em participações especiais, 19 nomes da MPB que, numa produção comercial, custariam mais de Cz$ 2 milhões - mas que, efetivamente fizeram questão de dividir com Alaide este seu retorno ao disco, numa produção cuidadosa de Zé Nogueira e Paulinho Albuquerque. Assim, Milton Nascimento, Rique Pantoja (arranjos e teclados), Heitor T.P. (violão e guitarra), João Baptista (baixo) e Jurim Moreira (bateria) estão em "Bela, Bela" (que Milton musicou a partir do poema de Ferreira Gullar); Gilson Peranzetta faz os arranjos e está no piano de "Absinto" (Fátima Guedes), com Zé Nogueira no sax-soprano; Ivan Lins concebeu um belo arranjo e divide a voz de seu "Choro das Águas"; o MPB-4 e Peranzetta estão em outro belo momento da BN: "Morrer de Amor" (Castro Neves/Fiorini). Egberto Gismonti, ao piano, em "Mais que Paixão" (parceria com João Carlos Pádua). "Amiga de Verdade" (Peranzetta/Aldir Blanc) tem apenas os teclados de Gilson, o baixo de Nico Assumpção: "Quem Sabe" - a mais bela faixa do elepê, de Elton Medeiros e Paulinho da Viola, com a presença vocal deste, mais Cristóvão Bastos (piano), Luís Cláudio Ramos (violão) e Marcelo Bernardes na flauta. O violão de Sebastião Tapajós e o piano de Peranzetta somam-se no emotivo "Estrada do Sertão", com a poesia de Hermínio sobre a música de João Pernambuco (1883-1947). Completando, "Teus Olhos, Meu Lugar" (Toninho Horta/Ronaldo Bastos) - com Toninho no violão e "Cinema Antigo" (Sueli Costa/Cascaso), com o piano de Wagner Tiso. Precisa dizer mais!
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
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02/10/1988

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