Carmen de Godard chegou no Itália
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 29 de julho de 1986
A reprise de "Salve-se Quem Puder (A Vida)", longa-metragem que marcou, em 1979, o reaparecimento de Jean-Luc Godard - após alguns anos de auto-exílio - teve um público surpreendente no Groff. Afinal, aos 56 anos, o ex-enfant terrible da Nouvelle Vague continua a ser o mais revolucionário dos cineastas contemporâneos. Pode-se gostar ou não de seu cinema anárquico, anticonvencional, difícil, hermético - mas é impossível permanecer indiferente às suas propostas visuais-estético-políticas.
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Assim, "Prenome: Carmen" - a versão policial que Godard realizou há 3 anos sobre o romance de Prosper Merimée (1803-1870) - e que estreou ontem (Cine Itália, 5 sessões) deve atrair um público amplo e diversificado.
Se as reprises de três clássicos de diferentes estilos - "Casablanca" de Michael Curtiz (1942), "Roma de Fellini" (1972) e "Quanto Mais Quente Melhor" de Billy Wilder (1959) não alcançaram o sucesso de público que se esperava (tanto é que cada um permaneceu apenas uma semana em exibição), com "Prenon: Carmen" espera-se que aconteça ao menos uma temporada maior.
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O romance escrito por Merimée em 1845 e que mereceu nada menos que sete refilmagens entre 1982/84 (versões de Peter Brooks, Carlos Saura, Francesco Rossi, entre outras) teve da parte de Godard um tratamento contemporâneo, misturando a sua própria presença - como cineasta - a uma estória policial - chegando até a dispensar a música de Bizet e utilizar os Quartetos de Beethoven.
Louis Marcorelles, o mais famoso crítico de cinema do "Le Monde", analisando "Prenon: Carmen" fez uma observação das mais felizaes que merece transcrição.
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"Jean-Luc Godard se o desejasse poderia nos contar histórias tão mágicas, tão lógicas quanto as de um Alfred Hitchcock ou de um Douglas Sirk, que tanto ele admirou - e sobre os quais ele escreveu páginas tão bonitas. Jean-Luc Godard que, um dia, reinventou o cinema picotando prazerosamente a continuidade, verdadeiramente contínua, de "Acossado" (A Bout de Souflle, 1959), condenado por excesso de tempo de duração. Esse Jean-Luc Godard nos dá a surpreendente nostalgia do grande filme que ele poderia, apesar de tudo,nos contar, retornando às regras que abalariam multidões".
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"Prenome: Carmen" é um filme para provocar diferentes reações. menos a indiferença. E se "Je Vous Salue, Marie" só continua sendo visto em péssimas cópias de vídeo-cassetes (algumas delas até alugadas por clubes da cidade) e "O Detetive", ainda não tem previsão de lançamento, fiquemos com seu "Carmen". Torcendo para que José Augusto Iwersen, editor da revista "Premiére", realize o projeto de promover uma grande retrospectiva de Godard, que percorrerá várias capitais - inclusive Curitiba.
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