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Aramis

A bênção, poeta!

Durante pelo menos 10 anos Vinícius de Moraes era uma espécie de Frank Sinatra nacional, em termos de sua presença em Curitiba. Diplomata, poeta, dramaturgo e, sobretudo, o grande letrista da Bossa Nova, Vinícius de Moraes permanecia curtido apenas em disco e livros nos anos 50/60, pois apesar de todos os convites e propostas nunca pode aceitar vir a Curitiba. Antônio Carlos Kraide, há 9 anos, chegou a dirigir um espetáculo, idealizado por uma fanzoca meio amalucada do poeta (cujo nome nem recordamos mais), intitulado "À Benção, Vinícius", que quase chegou a motivar a presença do poeta em Curitiba, para a estréia do espetáculo no auditório Salvador de Ferrante. Na última hora, entretanto, o autor de "Para Uma Menina, Com Uma Flor" acabou não podendo vir. Assim, quando em dezembro de 1971, há poucas semanas da data prevista para inauguração do Paiol - 27 de dezembro, entre o Natal e o Ano Novo - anunciou-se que não só Vinícius, mas também Toquinho, então seu novo parceiro, Marilia Medalha ("Ponteiro" , "Marta Saré", que defendeu nos festivais da Record, com o autor Edu Lobo) e o Trio Mocotó, houve muitos que não acreditaram. Jamur Júnior e Lais Mann, que na época apresentavam o "Show de Jornal", em pique de audiência na TV-Iguaçu, fizeram até blaque, comparando a anunciada presença de Vinícius no Paiol com as tão propaladas "visitas" de Sinatra ao Rio ou São Paulo. Mas o poeta e seus companheiros vieram. Vieram e gostaram da cidade, do teatro - a quem dedicaram "Paiol de Polvora" (cantada no show do dia 30, e, em 1972, incluída na trilha sonora de "O Bem Amado", primeira telenovela a cores da Globo) e, sobretudo, ficaram nossos amigos. Vinícius e Toquinho entusiasmaram-se com as idéias de Jaime Lerner - que sempre curtiu o poeta e a boa Música brasileira - de forma que, nestes últimos 8 anos, eles retornaram, por mais 4 ou 5 vezes: na segunda vez, em abril de 1973, já então com Clara Nunes, fizeram duas apresentações no Paiol, numa única noite, em que o teatro quase explodiu de tanto público. A partir de então, as temporadas não poderiam ser mais no pequeno teatro: já organizadas dentro dos Circuitos Universitários, Vinícius, e Toquinho - sempre com Azeitona no baixo e Mutinho na bateria - passaram a incluir suas apresentações no auditório. Bento Munhoz da Rocha Neto, onde desde ontem, fazem nova temporada - desta vez para comemorar os 10 anos de parceria, registrada também no lp da Polygram, lançado há um mês. Toquinho esteve duas outras vezes no Paiol: com o Quarteto em Cy, em fins de 1974; anteriormente, numa primeira apresentação pública com seu ex-professor de violão, Paulinho Nogueira. Mais do que compositores - interpretes, Vinícius e Toquinho são pessoas maravilhosas, que, como os grandes e reais talentos, sabem unir a simplicidade, a amizade, com a poesia, o amor, a alegria de viver a cada momento "como nunca mais". De Vinícius de Moraes já se escreveu muito, mas se nosso Pais tivesse mais gente preocupada com sua memória cultural, a bibliografia a seu respeito - fosse apenas biográfica, de elogios ou crítica - já deveria passar de 20 títulos. Infelizmente não há ainda um único (bom) estudo a respeito de sua imensa obra - poética, jornalística, musical; de sua personalidade fascinante, de homem que sempre assumiu integralmente seus amores, suas posições. Se Vinícius de Moraes existe, tudo é permitido, brincou, um dia, seu amigo Nelson Rodrigues, num dialogo da peça "Bontinha Mas Ordinária ou Oto Lara Rezende". Se Vinícius de Moraes existe - e felizmente ele está bem disposto, conservando em uisque e (muito) amor aos 66 anos - há também razão para aprendermos sempre a acordar, com um pouco mais de otimismo, acreditando que - tal como naquela sábia frase "today is the first day of the rest of your life"- o importante é amar, ouvir, cantar - ou ao menos curtir os bons momentos da vida, da música, que, de certa forma, estão em sua obra - com tantos compositores de talento - de Paulo e Haroldo Tapajós, seus primeiros parceiros, ainda meninos - a Toquinho (Antônio Pecci Filho, 34 anos), que há 10 anos está com ele nas estradas do mundo. Para comemorar os 10 anos de Vinícius e Toquinho, o produtor Fred Rossi, mais do que empresário um grande amigo desta dupla, convocou uma equipe da maior competência: Fernando Faro para a direção, Eliana Elias nos teclados, Pestana (José Albino Pestana de Medeiros) no sax, flauta e clarinete; Azeitona (Arnaldo Alves de Lima) no baixo, Mutinho (Lupicinio M. Rodrigues) na bateria, Papete (José de Ribamar Viana) na percussão e mais o grupo As Moedas, conjunto vocal formado pelas irmãs Lina, Dina e Adi. E se um grupo vocal está com Vinícius, é sinal verde para o sucesso: afinal, foi o poeta quem primeiro lançou aquelas 4 baianinhas: que se tornariam internacionalmente famosas com o Quarteto em Cy. Escrever sobre Vinícius é mais do que alegria: é emoção, por saber que está novamente na cidade - junto com profissionais que, antes de mais nada, são amigos e seres iluminados por terem o privilegio e a alegria de com ele dividiram momentos do maior significado. Afinal, a receita do poeta para viver um grande amor, é de que, entre outras coisas, ele (e todos nós, devemos imitá-lo) diz num de seus poemas - canções: "Não ando só / só ando em boa companhia/ Com meu violão / Minha canção / e a poesia/ ( >>>) É sempre necessário ter em vista/ Um Crédito de rosas no florista / Muito mais, mais que na modista".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Nenhum
1
01/06/1979

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